sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
quinta-feira, 2 de dezembro de 2010
INSTANTES
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Sir William Burrougs e sua pistola. |
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
terça-feira, 23 de novembro de 2010
domingo, 21 de novembro de 2010
terça-feira, 9 de novembro de 2010
AO CABO LIMA NETO COM CARINHO
Comemorávamos, desde o meio dia, o aniversário do Geraldo, o velho mais sem vergonha que já apareceu na face da Terra desde a construção da Arca de Noé. Bistequinha boa assando no canto esquerdo da sacada e tampas de Skol e anéis de latinhas de Brahma caindo divinamente em slow motion ao nossos pés; a farofinha e o vinagrete deliciosos preparados pela Dona Gonzaga e pela menina Jordana - nem preciso dizer que respectivamente mãe e filha do aniversariante. Tarde amena, recém agoada, com o vento gostoso e saliente bolinando nossos corpos e assanhando as madeixas do Renan e do Carlin, os hoje dois ex-cabeludos da fotografia - a qual, notem, nem era da era digital ainda.
"Não vou tomar café / nem escovar os dentes", deve ter cantado o Geraldo, acompanhado pelo Alain - que na época até tinha cara de Delon - enquanto eu e Jonhy, apoiados no parapeito, disputávamos o nosso Campeonato de Cuspe ao Alvo na Calçada, tendo como parâmetro de pontaria o desvio que o vento dava à massa de saliva durante a queda. Dona Gonzaga bebericava um pouco de vodka ou caipirinha, ou talvez um pouco de cada, provocando estupefação no Augusto, colega de trabalho do Geraldo, ao que ela retrucava afirmando que gostava de tomar um pouquinho para dormir. Dormir com o tontinho da cachaça. Dona Gonzaga morreu faz uns três anos, com idade bem superior à média de expectativa de vida do brasileiro. Grande Dona Gonzaga!
À noite, já tarde, apareceu o Alcindo, que todos os anos faz aniversário um dia depois do aniversário do Geraldo. Se eu acreditasse nesse negócio de bad vibrations, olho gordo, praga de Exu Caveira, afirmaria categoricamente que o Alcindo trouxe a reboque - como um mal olhado - o Cabo Lima Neto. Sim, Alcindo, porque pouco depois da sua chegada, o Cabo Lima Neto apareceu embaixo da sacada, no meio-fio, bêbado, louco, gritando, botando fogo pelas fuças, e no momento em que nós, curiosos, fomos ao parapeito para ver o que estava acontecendo, ele apontou o cano de um 38 na nossa direção e disse: "Desce! Desce, cambada de vagabundo, pra levar chumbo na cara!"
Alguém desceu? Que eu me lembre, não. E juro até hoje que vi a Dona Gonzaga dando uma cambalhota que a levou, célere, até a sala de estar. O resto foi um amontoado de pernas e braços tentando passar ao mesmo tempo por uma porta que dava acesso a outro local protegido. Os gritos do Cabo Lima Neto repercutiram mais um pouco na madrugada, até a chegada de uma segunda pessoa, que o convenceu a entregar-lhe a arma e acompanhá-la para casa, ordeiro, chorando, sem falar coisa com coisa. Era um amigo do Cabo, que o vinha seguindo desde uma lanchonete, onde, disse, o Lima Neto já havia comido três X-Tudo, quebrado mesas e deixado um rastro assustador de ketchup pelo chão.
Não deu outra depois do incidente. Só Cabo Lima Neto na veia. Louco, marido traído, esquizofrênico, revolucionário, desertor - viajávamos, potencializados pelo álcool, na busca de uma definição para o homem e a obra limanetianos. Nunca mais o vimos, Cabo. Infelizmente. Mas há uns três meses, vindo de Amarante para Imperatriz, e dando carona a um sargento da briosa Polícia Militar do Maranhão, perguntei se ele conhecia o Cabo Lima. O Cabo Lima Neto. "Aquilo é doido, atira até em pensamento". Não mencionei o caso do aniversário do Geraldo. Aprendi com minha professora de Educação Moral e Cívica que, se queremos conservar um mito, não devemos tentar conhecê-lo demasiado. Então prefiro lembrar do Cabo Lima Neto como um tempero daquele dia. Uma coisa boa. O limão que fez a caipirinha da Dona Gonzaga ficar mais deliciosa. O acorde preciso do Geraldo numa música do Gonzaguinha. A gordurinha gostosa da bisteca. E a tampinha premiada de Coca-Cola que eu encontrei pela manhã no caminho de volta pra casa.
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
EL PIBE D'ORO
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
DEURIVAL E O DISCO

"É como dizer que comeu a Carla Perez. Por que mais que seja verdade, ninguém daqui vai acretiar numa historia dessas. Não tem graça, já que a graça é contar pros outros. Então se o cara comeu, nem abra o bico senão vira piada. Imagina eu falando isso. Eu, gordinho de óculos fundo de garrafa. Quem vai acreditar se eu disser que comi a Carla Perez?"
Tenha ou não segurado o tchan da Carla Perez, a introdução do Deurival citando o exemplo da dançarina tornou a sua outra história - talvez tenha sido essa sua intenção - mais factível. Na verdade, acho que todos que estavam conosco no Bar do Gil, naquele ano de 2001, acreditaram piamente quando o Deurival afirmou ter visto um Disco Voador em uma chácara, tarde da noite, no momento em que ele e mais uns três heróis da resistência pegavam mais uma Antarctica dentro de uma caixa de isopor.
"E foi bem na hora que eu tava abrindo a cerveja no dente. Bem naquele chiadinho. Foi a tampa caindo e eu olhando, besta, aquele troço parado detrás da palmeira de coco babaçu, lá longe, perto do açude da chácara."
A princípio o Deurival não disse nada pros outros bebuns, mas o seu comportamento - o braço petrificado horizontalmente segurando a cerveja, o rosto também parado mirando o açude - chamou a atenção do dono da chácara.
"Que foi, Deuriva? Tá passando mal? Rapaz, se tu num guenta, bebe leite. Passa a cerva aí."
Deurival se levantou sem tirar o olho do Disco Voador e falou pros três homens que estavam com ele:
"Tão vendo ali, lá perto do açude? Tão vendo aquilo lá piscando detrás das palha da palmeira?"
Todos olharam pro local indicado pelo Deurival, menos o caseiro da chácara, o mais bêbado deles, que olhando pra outro rumo, perguntou:
"Caraio, que porra é aquilo mermo?"
Na época , por volta do ano 2000, não havia tefone celular com câmera embutida. O dono da chácara ainda correu pra dentro de casa à procura da Yashica da sua esposa. Não encontrou nada que pudesse registrar o fenômeno, nem caderno de desenho. Voltou pra varanda e chamou o Deurival e os outros para verificarem de perto o estrano objeto piscante.
"Vô nada", disse o caseiro.
Então foram o Deurival, o dono da chácara e um outro homem, pisando no capim alto e envergando os galhos de outras vegetações rasteiras. Aqui e acolá alguém tropeçava em algum buraco e ficava sem a cerveja do copinho descartável.
"Quando a gente tava chegando mais perto, vi melhor Disco Voador. Era parecido com uma bola de futebol americano, só que achatado e circular, quase do diâmetro de um LP.
"E o tamanho, qual era o tamanho?"
Deurival olhou ao redor do Bar do Gil sem encontrar nada compatível com o tamanho do OVNI. Até que viu, na frente da FAMA, algo que pudesse servir de exemplo.
"Tá vendo aquele ônibus ali que carrega estudante da FAMA? Pois era mais ou menos daquele tamanho."
Nessas horas sempre aparece um chato querendo fazer graça:
"E qual intinerário que tava escrito nele? Júpiter/Marte, via Ribeirãozinho?"
Deurival não se abalou, nem a gente sorriu do comentário idiota.
"Aí, quando a gente tava chegando bem pertinho dele, ele se movimentou lentamente e saiu detrás da palmeira e depois ficou parado em cima da gente. Cara, a coisa mais linda do mundo. Luz de toda cor saindo do fundo do bicho, parecia iluminação de boate. Acho que tinha algum ET querendo fazer contato com a gente, mas o idiota do caseiro apareceu correndo e gritando e rebolou uma manga no disco. Aí, meu amigo, foi que nem nos filmes. O disco se movimentou devagarzinho de novo e depois sumiu que nem um raio, sem deixar rastro."
Nesse momento apareceu o presidente da turma na esquina da UEMA e disse que a professora de Introdução ao Pensamento Geográfico ia iniciar a chamada. No caminho da sala de aula perguntei:
"E a manga, Deurival, o cara acertou a manga no Disco Voador?"
"Acertou, o desgraçado. E impressionante é que de manhã, quando voltamos ao local em que o Disco estava, procuramos a manga que o doido jogou e encontramos só o caroço. E a palmeira tava com as palhas tudo murcha."
"E a Carla Perez, não apareceu voando por lá também não?", perguntou o chato.
"Não, viado, mas a tua mãe passou muntada numa vassoura."
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
CASO SERRA: NÃO HOUVE OVNI GLOBAL
VÍTOR GONÇALVES NETO (IV)
Mas o que aconteceu foi ontem em Porto Alegre para onde fugi sem conhecer ninguém e vice-versa. Comecei a deflorar a cidade nua com os olhos úmidos de emoção. E fui esbarrar numa praça tão florida quanto as outras e cujo nome nem quis saber. Era uma praça e pronto. Um vento frio cortava o tempo da tarde e casais se aninhavam numa bolinação mútua e quente nos demais bancos. Foi justamente quando o vi. Um garoto todo enrolado em trapos de lã, de calças compridas e pés descalços. Nas mãos uma caixa de engraxate e um sorriso de dentes alvos saindo dos lábios vermelhos que entoavam uma canção. Vinha no meu rumo com sua carga de tintas e de alegria. E foi se abaixando nos meus pés já assoviando e abrindo uma lata de graxa marrom. Pois justamente neste mesmo instante um casal se senta ao lado com um garoto da mesma idade com trajes ricos e sapatos lustrosos como sua face também. E dirigiu um olhar e um sorriso talvez de mofa ou compreensão ao engraxatezinho que se levantou derrepentemente transtornado e num instante desapareceu entre as ávores agora carregando sua carga de inúteis tintas. E de imensa tristeza também.
Nesta manhã enevoada do dia seguinte a esse acontecimento já distante de Porto Alegre alguns quilômetros, fico olhando as fachadas alemãs das casas de Novo Hamburgo. Ali se aninham nada menos que 500 fábricas de calçados trabalhando diuturnamente. São milhares de sapatos (muito milhares mesmo) que ficam no Brasil e que são exportados para as estranjas. Só que não sobrou de todos eles nenhum par para o pequenino engraxate de Porto Alegre todo enrolado de trapos de lã. As calças compridas. Os pés no frio chão. Relembro de quando ele vinha saltitante no meu rumo cantando uma canção. De quando seu assovio se chocou com o sorriso de mofa ou de compreensão de outro menininho rico. De quando ele derrepentemente desapareceu entre as árvores da praça tão triste quanto um palhaço na hora da viuvez. Carregando sua caixa de tintas. Sua capa de inocência. Sua carga de revolta.
(23.11.1980)
Vítor Gonçalves Neto
In: Crônicas das Andanças: dos vivos e dos mortos, dos bichos e das fêmeas e de outras coisas que tais. Imperatriz: Ética, 1995.
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
MARILENA CHAUI
A tal informação e os interesses da informação da propalada liberdade de expressão.
INSÔNIA

Liga e desliga a TV. Calça o chinelo. Abre e fecha a geladeira. O olho no olho mágico flagra a motoqueiro vigilante urinando no poste. O cachorro late para não perder o costume de latir. O vizinho ronca alto.
O olho mágico flagra o olho olhando-o. O vizinho roncando é alto. Fecha a TV. O poste urina no motoqueiro vigilante. Liga a geladeira. Descalça o chinelo. O latido acorda o cachorro acostumado a latir.
O vizinho ronca no olho mágico. O motoqueiro vigilante abre a geladeira. O latido do cachorro liga e desliga a TV. O poste alto calça o chinelo. O costume fecha o olho.
Liga e desliga a TV deitado numa cama de rãs. Abre e fecha a geladeira com a cabeça apoiada num travesseiro de gafanhotos. Embrulhado num lençol de espinhos olha no olho mágico e flagra o motoqueiro vigilante urinando no poste.
Ao amanhecer- o cachorro late acostumado, o vizinho ronca alto - vê a professora jovem passando para o colégio com óculos escuros e pensa que a insônia é uma Medusa de Rayban
sábado, 16 de outubro de 2010
DAS PROIBIÇÕES

No Amarante, numa mesa de bar, conversávamos sobre os avisos impressos em papel A4 e pendurados em algumas repartições púbicas. Além da corriqueira frase Desacatar funcionário público - seguida das respectivas sanções penais: detenção, de seis meses a dois anos -, a sentença É proibido entrar trajando bermuda também é um aviso típico nesses recintos, principalmente naqueles onde o trânsito de certas autoridades é frequente. O engraçado é que a norma não vale para as mulheres que andam de saia, de bicicletinha, uma mão no guidon e a outra tampando a calcinha. Enquanto elas, lindas e loiras, transitam sem ser molestadas por fóruns e prefeituras, os homens são barrados pela simples falta de tecido nas canelas. Em alguma cidade do Brasil, um juiz recusou-se a atender um homem que calçava um chinelo e não um sapato novo e engraxado. Um sujeito sem sorte: além de pobre, humilhado. E pensar que o problema aí não foi a falta de tecido nos cambitos sertanejos - o homem trajava uma calça melindrosamente engomada -, mas falta de couro.
Desde o prédio antigo, ali em frente ao colégio Dorgival, eu frequento a Biblioteca de Imperatriz. Quando desastrosamente a mudaram para o Bolsa Família, perto do Shopping Timbira, de quebra mudaram também o seu diretor: no lugar da velha gorda, simpática e fumante, colocaram um velho ranzinza e não fumante que andava com uma perna de madeira debaixo do ombro. Quando os frequentadores ouviam o toc toc da muleta martelando no pátio que dava acesso à sala de leitura, todos ficavam mais tensos que silenciosos. Uma vez me desentendi com o velho da muleta. Ao me ver numa salinha separada da sala principal com tres livros sobre a mesa, o velho disse que eu não podia ficar ali e muito menos poderia ter pego três livros ao mesmo tempo. Eu disse que não ia sair e ia continuar lendo os três livros. Ele me chamou para olhar uma cartolina onde continha as normas da biblioteca: "Proibido conversar, proibido riscar, proibido pôr os cotovelos sobre os livros, proibido mexer nas prateleiras." E embaixo disso tudo, destacado: "À diretoria". Eu disse que tava tudo errado. "Como assim tudo errado?", bodejou o velho. "Pra começar, aqui é um lugar público. Então no mínimo o público deveria ser consultado sobres essas normas antes delas serem criadas. E além do mais, essas proibições são apenas para a diretoria, né? Ou o senhor vai dizer que craseou "À diretoria" sem querer ?".
No Old Claudeci, era "proibido sentar na cinuca", mas não apenas isso. Falar alto, mexer no DVD, aumentar o volume - tudo era alvo da represália do vascaíno com cara de português de Montes Altos. Era tanta aporrinhação que começamos a fazer piada. "Daqui uns dias vair ser proibido sujar os copos de cerveja também", falávamos. Em 2006, no famoso Bar do Léo, em São Luís, eu, Sandra, Diana, Frederico e outra menina chegamos às sete da manhã pra beber. Quando o Léo levantou o portão do mercado onde funciona o seu bar, de cara percebeu que estávamos grogue (bebíamos desde as oito da noite do dia anterior), mas mesmo assim serviu uma Antártica pra gente naquelas simpáticas mesinhas quem têm um pedal de maquina de costura embaixo. Bebemos brocados: entre uma golada e outra, traçamos um suculento galeto assado e umas duas mangas de vez. Aí, pela tarde, todo mundo doido, começou a beijação. Me lembro que enquanto o Frederico atacava os lábios de alguém, me levantei e fui até a Sandra e a beijei com um gosto de língua, frango assado e manga de mesa. Não demorou uns trinta segundos pro Léo nos separar dizendo que ali não aceitava "uma sem vergonhice dessas". Na saída do bar, não vi nenhum aviso proibindo beijo, mas vi algumas placas proibindo tocar violão e dançar.
Enchi linguiça até agora para dizer que na semana passada, numa Quarta Rock da Texana, me desentendi com o segurança que fica na porta da boate. Havia acabado a show da Pilantropia e eu, Jonhy Animal e Fabinho Cara de Pombo decidimos mexer um pouco a bunda ao som de música eletrônica e sentindo aquela fumacinha cheirosa na cara. Na entrada, o segurança me barrou. Disse que eu não podia entrar com o capacete. Perguntei onde havia a norma proibindo a entrada de pessoas com capacete na boate. Ele disse simplesmente que era determinação do dono do estabelecimento. Retruquei novamente e disse que se houvesse tal norma, ela deveria estar visível para os frequentadores da Casa. Um aviso escrito em papel A4 era o bastante - e a publicidade, dever da Casa e direito do frequentador, evitaria maiores transtornos. Mas como não havia nada - o único aviso fixado ao lado da porta era proibida a entrada de menores de 18 anos - eu disse que iria entrar com capacete e tudo. Quando vou ultrapassar a porta, o segurança - do alto de sua estupidez e vaidade de Leão de Chácara - esticou o braço de 40 centímetros de largura na minha frente. Foi a gota de cerveja. Aí eu boçalizei. "Porra, caralho, agora eu vou é te prender por constrangimento ilegal, seu merda." E ia mesmo, mas o Fabinho Cara de Pombo entrou no meio, pegou meu capacete, me empurrou pra dentro da boate e disse que ia resolver a parada. Depois de uns dois minutos o Fabinho aparece bebendo uma Skol Beats no gargalo e descendo até o chão ao som do Black Eyed Peas. Grito no ouvido dele: "E o capacete?". E o Fabinho, dando um baforada num Free: "Convenci ele a guardar pra mim."
*
Na ilustração acima, desenho do argentino Leo Durañona narrando o conto Diante da Lei, de Franz Kafka, incluso na HQ Kafka em Quadrinhos.
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
O MESMO
Na porta do Plantão Central, vários repórteres já esperam o mesmo, que chegou algemado e segurando a bicicleta pendurada pelo lado de fora do camburão. Na permanência, perguntado por um repórter – um repórter gordo – sobre o motivo de seu calção estar rasgado, o mesmo falou: “Num ti interessa”. O repórter gordo ficou alterado e gaguejou por uns instantes, mas logo posicionou-se olhando para câmera de modo que o mesmo, algemado, aparecesse em segundo plano atrás de si: “Um vagabundo desse ainda é saliente! Rouba e fica tirando graça. É muita cara de pau de mermo... Depois que a população mata um infeliz desse de paulada aí vem os direito zumano defender uma praga dessa.” Depois, recomposto, perguntou ao policial: "Cabo Deusimar, como se deu a prisão do mesmo?" O policial encostou o braço no balcão da permanência e disse: “A gente tava fazendo o patrulhamento de rotina no centro quando fomos avisado de que o mesmo tinha roubado uma bicicleta. Aí a gente caiu em campo e conseguiu capturar o mesmo. Na hora da prisão ele já tava dominado pela população que aliás já tinha batido muito no mesmo”. O repórter gordo então comentou, apontando para o mesmo: “Esse pode levantar as mão pro céu, minino!”. E depois, colocando uma mão no ombro do Cabo Deusimar: “Se num fosse o polícia aqui, a população tinha dado um jeito no mesmo”.
Outro repórter – esse baixinho e careca – chegou perto do mesmo e perguntou: “Rapais, por que tu robô essa bicicleta, a bicicleta de um trabalhadô?” O mesmo respondeu, cabisbaixo: “Num sei não, dotô. Parece que é uma doença que eu tenho, essa de robá”. O repórter se afastou do mesmo e, falando baixinho, bem próximo à câmera, como se falasse naquele momento somente com o telespectador: “Doença? Essa é nova! Isso é muito é um mão de carrapicho, meu amigo: onde bate, aprega”. Depois, retornando ao mesmo: “Rapais, sai dessa vida, tu é novo. Te entrega pra Jesus. Trabalha que tu consegue as coisa.” E enquanto o mesmo era conduzido pro gabinete do delegado, o repórter baixinho e careca posicionou-se na frente de um banner promocional e anunciou: “Tá pensando em construir? Tijolo? Cimento? Pia? Telha? Vaso sanitário? Não tem outro não, é Material de Construção do João.”
Quando o mesmo adentrou no gabinete, lá já estava a repórter bonita e cheirosa, em momento íntimo com a autoridade policial. Enquanto o delegado, desprevenido, tentava acertar o buraco do botão da calça, a repórter bonita e cheirosa, tentando se recompor, ajeitava o cabelo e segurava o microfone com força além do habitual. Comunicado por Cosme e Damião a respeito do delito, o delegado – um homem jovem e disposto – procedeu à autuação em flagrante delito do mesmo. Perguntado ao mesmo o por que do furto, o mesmo respondeu: “Sabe, dotô, eu só ia dá uma volta na biscleta, depois ia dechá ela lá no mermo lugar”. Terminado o flagrante e recolhido o mesmo para o presídio, a repórter bonita e cheirosa barganhou uma entrevista com o delegado. No jornal das sete, ela perguntou: “Delegado, o que o mesmo disse a respeito do furto da bicicleta”. “Ele, como todos os outros meliantes, a principio negou, mas no fim acabou reconhecendo a autoria do delito. Interessante é a motivação defendida pelo mesmo: um simples passeio. Segundo o mesmo, ele queria a bicicleta apenas para passear, devolvendo-a depois ao dono. Ora, é sabido que na França isso é possível. Lá o governo disponibiliza um serviço que possibilita a qualquer citadino apanhar uma bicicleta em determinados pontos da cidade e usá-la por determinado período, desde que pague uma taxa para tanto e devolva a bicicleta onde a apanhou ou em outro ponto credenciado. O que não é o caso do Brasil e muito menos do mesmo, evidentemente. Então temos quase certeza de que o mesmo iria trocar a bicicleta por pedras de crack, já que manchas nos dedos do mesmo denotam o uso regular do entorpecente.”
Terminada a entrevista, a repórter bonita e cheirosa enlaçou o delegado e sussurrou, quase enfiando a língua em seu ouvido: “Gosto muito desse teu cheiro de homem. Meu gostoso...” E o delegado, apertando-a pela cintura de modo a fazê-la sentir o volume de sua pistola e levantando-a um pouco acima do chão: “Hum... é mesmo?”
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
BUKOWSKI
In: Bukowski declamando poema em trecho do documentário Born into this (2003), de Jonh Dullaghan.
sábado, 11 de setembro de 2010
RENATA

quinta-feira, 9 de setembro de 2010
AS PONTES DA GAUTAMA DEPOIS DA CURVA DA MORTE
Quando retornávamos da visita ao túmulo do companheiro morto, decidimos passar por São Benedito do Rio Preto, a cidade onde ocorreu o acidente, mesmo sabendo que isso implicaria em muitos quilômetros a re-percorrer. Um tio do nosso amigo, dirigindo uma caminhonete prata na frente, foi o nosso guia. Vimos o local do acidente e depois o carro, que de tão amassado na parte traseira - era um Corolla preto -, mais parecia um Ford K. Conversando depois com o senhor da caminhonete, descobri ser ele pai de uma amiga minha (Niciane, contemporânea de Uema) e que a caminhonete que ele dirigia era a mesma que a Nice havia avisado, via Orkut, há cerca de um mês, que tinha sido roubada. Já estava escurecendo quando partimos. Aconselhados pelo pai da Nice, pegamos um atalho na viagem (que segundo ele nos economizaria uns 200 quilômetros) e encaramos a estrada vicinal que liga (ou antes desliga) Vargem Grande a Coroatá. Na partida fomos avisados dos desvios existentes ao lado de cada ponte de madeira. Logo no primeiro desvio, ao lado de uma ponte feita de estacas já podres, vimos uma outra ponte, ou antes os esqueletos dela, enorme, de concreto armado, esticada ao longo das cabeceiras de uma estrada que não existe. E assim, pontuando os buracos do caminho, elas foram aparecendo, imponentes e inúteis. Eram - não havia dúvida - as pontes da construtora Gautama.
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
segunda-feira, 16 de agosto de 2010
ALEXANDRE RIBEIRO
Tua ausência leva minha presença a não-estar. O convívio comigo se torna quase insuportável, meu olhos se enchem d’água quando me percebo sozinho, estático, desolado. Meu sorriso já não faz tanto sentido sem a apreciação dos teus olhos. Degolado, como um rei distante, ligeira falta de ar oprimindo os olhos, a boca, arquejante se arrastando por entre este vale sombrio indizível, porém acordado, é só o que permanece. Pessoas passam, mas é como se fossem tão vazias de transparentes. As palavras me atravessam, ele se sente perdido diante delas, um corpo boiando em um rio profundo e raso cheio de pedras e flores murchas, um livro de não-páginas. Próximo e distante a um só tempo, ele busca saídas do labirinto que ele mesmo criou mas não lembrou de colocar pelo caminho as migalhas de alma. A vontade indômita e desprevenida de estar em lugar nenhum, ou algum lugar o mais distante possível de todos que só uma lágrima pode alcançar, pálida e magra e triste moça com uma rosa nas costas nuas cheia de devaneios. A palavra, calada, grita, geme minha dor imperdoável de ser, mas nunca permanecer. Permanecer respirando. Morrer constantemente. Por isso baixar a cabeça se torna a única fuga imóvel da imobilidade de tudo que passa ao redor turvo. Letras letárgicas mal feitas dizem que.
II
Vi de longe que ela escrevia um bilhete encurvado. Não sei se colocava ali toda a tristeza que sentia, ou se estou com poucos cigarros, guardarei para mais tarde. De repente ela deu com o punho fechado na mesa, talvez ali a dor acabasse de atingi-la em cheio. Apenas seus olhos não vi mexer, o corpo todo percebi os trêmulos. Não sei se ela ouvia todas as vozes que agora corroíam o silêncio da ampla sala. Parece que não. Senti-a invencível ali sentada, cabeça baixa e ar de quem conjectura tão inebriante quanto duramente. Para quem escreveria? Quem receberia aquela tempestade feita em letras tão juntas? Ousei pensar em ir até lá, receber o soco daqueles lábios crispados, o cuspe de ódio daqueles olhos contraídos. Então ela sorriu e me quebrou a espinha dorsal. Tudo era doce novamente, eu é que era o amargo. Vi as paredes me fechando e o vacilo descomunal de todas as coisas. Céus, como eu era absurdo.
III
Facas pontiagudas, odes do ofício,
Flores angulosas, dores permanentes...
E de mim não há resquício.
Seios rastejantes, quimera amarga,
Preço alto, este frio indecente...
E no braço o olhar que não me larga.
No vento a semente que não se espalha,
Minhas veias são raízes de uma mortalha,
O corpo inerte, nada que o valha,
Minh’alma queima como queima a palha.
quarta-feira, 28 de julho de 2010
MEMORINHAS
sábado, 17 de julho de 2010
terça-feira, 13 de julho de 2010
POP-UP! - A FESTA (II) E ANIVERSÁRIO DE IMPERATRIZ
Dia 15 de julho, véspera do aniversário de Imperatriz, acontecerá na boate Usina a festa Pop-Up!, que irá reunir o que há de melhor no universo da música pop.
Dois Dj's comandarão a pista tocando muito dance, synthpop, electro, indie, rock etc.
A festa é organizada por alunos da UFMA, que pretendem trazer uma nova proposta de evento para a boate Usina e uma alternativa diferente de diversão para os jovens de imperatriz.
Através do site da festa você pode colocar seu nome na lista e pagar menos na entrada.
Não será permitida a entrada de menores de 18 anos.
No dia 15 de julho, a partir das 21 h, ninguém vai ficar parado na festa Pop-Up!
(*) Com informações (texto) de Flávia Novais.
ANIVERSÁRIO DE IMPERATRIZ **
A cidade de Imperatriz, a princesa do rio Tocantins, completa neste dia 16 de julho, 158 anos. Influenciada por diversas regiões, a música e a cultura urbana de nossa cidade apresenta vertentes de todas as tribos, seja no hip-hop, no reggae, no rock ou na música popular. Buscando valorizar e incentivar essas correntes, a Fundação Cultural de Imperatriz realiza no dia do aniversário da cidade o palco livre, Show das Tribos, dentro da programação oficial.
O Show das Tribos começara por volta das 17h, no mesmo local e estrutura que se apresentarão o ex-RPM Paulo Ricardo e as atrações regionais. “A nossa proposta é garantir a vez e a voz desses movimentos que tem o seu próprio público, democratizando cada vez mais nossos espaços públicos, uma vez que assim como a festa, Imperatriz é de todos nós”, explicou Lucena Filho, presidente da Fundação Cultural de Imperatriz.
O Hip-Hop será comandado pelo grupo Depoimento Pessoal, que junto com a organização de hip-hop, Imperafro levaram as 4 vertentes do movimento para a Avenida Beira-Rio. “Vamos fazer a apresentação de b-boy, intervenção de grafite, discotecagem do DJ Bronkcs e o nosso show de rap”, afirmou o MC Marcos Fly, componente do grupo que tem mais de 15 anos de estrada.
A massa regueira imperatrizense também terá a sua vez. O DJ Lepurinus apresentará a sua session em quatro etapas, com o melhor do reggae internacional, nacional, um especial de dub e um tributo especial a Bob Marley. Em outra vertente, mais diversificada ainda, o público presente terá a chance de conhecer um movimento que cresce cada vez mais em Imperatriz. Regida pelos colecionadores de vinil Jairo Sade e Loro da Matemática, a discotecagem com radiola rememorará os grandes clássicos do rock, da música popular e alternativa.
(**) Com informações (texto) de Antônio Fabrício
terça-feira, 6 de julho de 2010
ROBERTO PIVA (II)

Praça da República dos meus Sonhos
A estátua de Álvares de Azevedo é devorada com paciência pela paisagem
de morfina
a praça leva pontes aplicadas no centro de seu corpo e crianças brincando
na tarde de esterco
Praça da República dos meus sonhos
onde tudo se faz febre e pombas crucificadas
onde beatificados vêm agitar as massas
onde Garcia Lorca espera seu dentista
onde conquistamos a imensa desolação dos dias mais doces
os meninos tiveram seus testículos espetados pela multidão
lábios coagulam sem estardalhaço
os mictórios tomam um lugar na luz
e os coqueiros se fixam onde o vento desarruma os cabelos
Delirium Tremens diante do Paraíso bundas glabras sexos de papel
anjos deitados nos canteiros cobertos de cal água fumegante nas
privadas cérebros sulcados de acenos
os veterinários passam lentos lendo Dom Casmurro
há jovens pederastas embebidos em lilás
e putas com a noite passeando em torno de suas unhas
há uma gota de chuva na cabeleira abandonada
enquanto o sangue faz naufragar as corolas
Oh minhas visões lembranças de Rimbaud praça da República dos meus
Sonhos última sabedoria debruçada numa porta santa
In: Paranoia. São Paulo: Massao Ohno, 1963.
Interminável-Esterminável
(ouvindo Barney Kessel)
anjos com botas vermelhas
(dez aparições de leopardos na
janela do apartamento)
Mickey Mouse deve ser agente da CIA
câncer-policial do mundo e seus velhos
Totens
durmam durmam como rocamboles mijados
Giorgio de Chirico & suas
paisagens feitas de sombras
garoto triste a orgia te espera
com cactos de veludo
antes que a noite se esborrache
eu quero ver tuas
coxas na
televisão estrelada
intestinos lunares sob a luz-neon
acariciando teus cabelos jabuticabas
encaracoladas
In: Abra os olhos e diga ah! São Paulo: Massao Ohno, 1975.
APAVORAMENTO N° 1
dezoito garotos & dezoito garotas foram emparedados vivos
em caixas construídas com chicletes que só Adams fabrica &
tostados dentro de um porão de arsênico & cascavéis.
APAVORAMENTO N° 2
quinze adolescentes de ambos os sexos foram chicoteados na
bunda por batalhões da TFP que os insultavam enquanto
trezentos rapazes & moças de seita imperialista Igreja Católica
cortavam rodelas de cebola & colavam em seus olhos.
In: Coxas. São Paulo: Feira de Poesia, 1979.
XIV
vou moer teu cérebro. vou retalhar tuas
coxas imberbes e brancas.
vou dilapidar a riqueza de tua
adolescência. vou queimar teus
olhos com ferro em brasa.
vou incinerar teu coração de carne &
de tuas cinzas vou fabricar a
substância enlouquecida das
cartas de amor.
In: 20 poemas com brócoli. São Paulo: Massao Ohno/Roswitha Kempf, 1981.
5. Viking 1
Queria reler Vico mas não posso / queria ler fico mas não fossa /
queria tomar pico mas na roça / queria virar mico sem a coça / queria ouvir Chico lá na choça / queria ficar rico sem a joça / queria ver o Angico na palhoça / queria ser Cristo mas na nossa / queria ser lírico na poça / queria mais um tico dessa troça
In: Quizumba. São Paulo: Global, 1983.
Bules, bílis e bolas
Nós convidamos todos a se entregarem à dissolução e ao desregramento. A Vida não pode sucumbir no torniquete da Consciência. A Vida explode sempre no mais além. Abaixo as Faculdades e que triunfem os maconheiros. É preciso não ter medo de deixar irromper a nossa Alma Fecal. Metodistas, psicólogos, advogados, engenheiros, estudantes, patrões, operários, químicos, cientistas, contra vós deve estar o espírito da juventude. Abaixo a Segurança Pública, quem precisa disso? Somos deliciosamente desorganizados e usualmente nos associamos com a Liberdade.
In: manifesto Os que viram a carcaça.
terça-feira, 29 de junho de 2010
IURI PETRUS
Era um desses domingos em que acordo só porque o estômago começa a doer, mesmo depois de passar quase três horas esperando que num passe de mágica aquela sensação fina e aguda desapareça para continuar sem encarar aquele dia. É, não deu...O corredor do apartamento tá um mormaço purgatorial (o corpo quente, mas sem suar) e sinto a sujeira da noite anterior de trabalho numa multidão que tenta ser carnavalesca com muitas mulheres pedindo para ser presas, massacradas e sodomisadas. Tomo banho. Então saio na minha missão de calar o corpo (talvez fosse melhor esquecê-lo) com um pouco de comida - quem sabe depois ele não se cansava e dormia me afastando daquele dia. Só que nada pior do que a sonolência leve com mistura e confusão de percepções trazendo uma feliz e fugaz sensação do ilimitado da imaginação repentinamente evaporada e doída... Sinto o meu pau pulsar e fico acariciando-o como quem pedi a um bichinho de estimação para ficar quietinho mas, ao mesmo tempo, fica atiçando o bichano como a fazer 8 grosando-o minhas pernas. Não tem jeito: vou ter que gozar. Como tô sem muito saco para encarar certas pessoas, apelo para a imaginação, achando que ainda sobrou um pouco, ao menos para resolver este probleminha! A merda é que nem isso me sobra e tenho que procurar os arquivos mortos e ocultos do meu computador. Até pensei em procurar asiáticas e indianas na web como que num devaneio antropológico e antropofágico de terceiro mundo, mas minha cabeça não tava muito aberta para novidades... Só queira gozar e jorrar. Vejo Bentinho, como que numa espécie de alter-ego do diretor do filme pornô autoreferenciando-se como leitor de Machado e Eça, um seminarista que não consegue se conter frente à tentação de sua priminha safada e a come no chão da sala. Fico vendo aquela mulher e ela me parece tão real, nada parecido como aquelas gostosonas de bundas e peitos enormes e suculentos que se esgoelam de tanto gritar e parece que não gozam nada. Ela tem uma beleza de poucas proporções, pernas finas e duras, seios pequenos e caídos, pentelhos aparados e um grelo tímido. Ela estava realmente sedenta para sentir-se preenchida, mesmo que fosse apenas sua atuação, mas atuava bem... Por essa hora já devia ter gozado há muito e, apesar da solidão e decadência sentidas, fiquei encantado com ela. Sei que ela gozou muito ali naquele chão, via na sua cara, em suas expressões de tesão e desejo cheias de uma alegria fugaz misturadas com a tristeza do pós-gozo. Apesar de todo encantamento já estava contentado e comecei a ler as últimas notícias em um site qualquer quando vi que uma tal atriz que já foi global mas que em seus tempos não áureos fez filmes pornográficos, havia sido encontrada morta em seu apartamento em alguma grande cidade que não me lembro o nome, ao lado de alguns anti-depressivos e talvez uma carta de despedida. Era uma tal Leila Lopes. Fiquei curioso e procurei alguma imagem... Era ela a moça real que me encantou no filme pornô. Gozamos, morremos e tédio. Mas no fundo fiquei feliz porque havia comido uma defunta... E me senti mais humano.
quinta-feira, 24 de junho de 2010
ALÉM DA TV OKAZAJO (III)
Dias 26 e 27 de junho (sábado e domingo, às 19h e 21h), no Teatro Ferreira Gullar.
sábado, 19 de junho de 2010
ROBERTO PIVA
Eu urrava nos poliedros da Justiça meu momento abatido na extrema paliçada
os professores falavam da vontade de dominar e da luta pela vida
as senhoras católicas são piedosas
os comunistas são piedosos
os comerciantes são piedosos
só eu não sou piedoso
se eu fosse piedoso meu sexo seria dócil e só se ergueria aos sábados à noite
eu seria um bom filho meus colegas me chamariam cu-de-ferro e me fariam perguntas por que navio bóia? Por que prego afunda?
eu deixaria proliferar uma úlcera e admiraria as estátuas
de fortes dentaduras
iria a bailes onde eu não poderia levar meus amigos pederastas ou barbudos
eu me universalizaria no senso comum e eles diriam que tenho
todas as virtudes
eu não sou piedoso
eu nunca poderei ser piedoso
meus olhos retinem e tingem-se de verde
Os arranha-céus de carniça decompõem nos pavimentos
Os adolescentes nas escolas bufam como cadelas asfixiadas
arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através do meus sonhos
In:Paranoia. São Paulo: Massao Ohno, 1963.
A PIEDADE - COM ROBERTO PIVA E BEAT GENERATION
In: Filme produzido pelo grupo Interzona, a partir do poema Piedade, com vozes de Roberto Piva, Jim Morrinson, Willian Burroughs, Patti Smith, Jack Kerouac, Antonin Artaud. Músicas de Stockhausen, Lou Reed e Morfine.
quinta-feira, 17 de junho de 2010
CÓPULAS DO MUNDO
quarta-feira, 16 de junho de 2010
ALDA
segunda-feira, 14 de junho de 2010
CINEMA NO TEATRO
07/06 - O BEIJO DA MULHER ARANHA, de Hector Babenco
Responsável pela Exibição: Fernando Ralfer
14/06 - RITUAL DOS SÁDICOS/DESPERTAR DA BESTA, de Zé do Caixão
Responsável pela Exibição: Iuri Petrus
21/06 - DONNIE DARKO, de Richard Kelly
Responsável pela Exibição: Marina Cardoso
28/06 - PRECIOUS, de Lee Daniels
Responsável pela Exibição: Marcelo Ricardo
Filme Suplente:
WAKING LIFE, de Richard Linklater
Responsável pela Exibição: Theylon
sábado, 5 de junho de 2010
O ROTEIRO DAS SETE PONTES
No horário combinado embarcamos. Na frente (o veículo era uma L200 4x4) entraram o motorista, o delegado, um sargento e um cabo PMs – quase a metade do efetivo policial da cidade –, além do ar frio do ar-condicionado. Atrás, na carroceria, disputando pedaços de colchões improvisados como assentos, entramos eu, um soldado, um guarda municipal e mais dois policiais civis. Mesmo sabendo que uma chuvarada se agasalhava no céu amarantino, decidimos partir. E fomos. Todos juntos, fomos – pra frente, Brasil, Brasil, nossa seleção.
A estrada que leva ao Inferno não deve ser muito diferente da estrada que percorremos. Ladeiras íngremes, trechos esburacados, cortinas de poeira, crateras. Em ambos os lados, soberbas fazendas e a vegetação devastada, queimada, com muito gado aparentado mastigar capim sintético e pouquíssimos animais silvestres à vista. Durante a maior parte da viagem, apenas alguns urubus nos acompanharam em vôos panorâmicos. Em trechos menos devastados, um ou outro carcará no topo de alguma árvore chamuscada. Na ausência de mais animais, chegamos a imaginar, ao cruzar um baixio alagado, sucuris se arrastando imperceptíveis como as nuvens longínquas, espessas, pretas, aqui e acolá vazadas pelo sol.
Não tardou para que a chuva chegasse. Algum bonachão ainda sugeriu, de dentro da cabina, que o veículo estacionasse num local coberto para que nós, da carroceria, fôssemos poupados do aguaceiro. Recusamos, ostentando a típica dissimulação dos ofendidos, e deixamos a água nos purificar, lavando nossos corpos barrentos. Depois da chuva, novamente apareceu o sol, mas não tão quente quanto antes. Ao atravessar um vale, visualizamos um arco-íris imenso, majestoso. Lembrei dos meus tempos de menino. “Aquele arco-íris deve estar chupando a chuva”, pensou o menino.
Nossa primeira parada no tortuoso caminho das Sete Pontes foi o assentamento Alvoradinha, o maior e mais organizado do percurso, com energia elétrica, telefonia fixa e associação de moradores. Lá o delegado colheu depoimentos acerca de uma tentativa de homicídio. A vitima, um guarda municipal, havia sido “retalhada” a golpes de facão, após badernar e exibir seu revolver nos bares do centro da localidade. Mais adiante, a imagem mais dolorida, o retrato nu e cru – aqui cabe bem o clichê – da total ausência do Estado – a ocupação denominada Ouro Preto e seus casebres de bambu, mães adolescentes solteiras, energia elétrica ausente. Depois de outro depoimento colhido, seguimos. Na saída, um menino emparelhou-se à caminhonete, e, empurrando um aro enferrujado de bicicleta com um bastão deslizando pela calha, tentou nos acompanhar, disputar uma corrida. Ficaram para trás ele, seu aro enferrujado e o Ouro Preto.
Ápós oito horas de viagem, enfim avistamos a primeira das sete pequeninas pontes que dão nome à localidade (que termina num bar localizado na sétima ponte, na divisa entre Amarante e Açailandia). Fomos lá para caçar os assassinos de outro guarda municipal, morto durante uma bebedeira, com um tiro de espingarda. Chegando no bar onde o crime aconteceu, encontramos um dos suspeitos nas proximidades. Três dias depois, ele havia retornado. Fiquei pensando sobre aquela máxima que diz que o criminoso sempre retorna ao local do crime. Se verdade, se mentira, ali estava o homem, no mesmo local. Morbidez? Curiosidade? Raskolnikov, dias após assassinar a velha usuraria, também retornou ao quarteirão onde partira o crânio da idosa com um machado. Talvez o motivo seja um “chama”, uma “força gravitacional” muito forte que faz com que o homicida retorne. Ou, como se diz no Sertão, uma moeda colocada pelos populares debaixo da língua do morto.
Negando a princípio, o suspeito acabou confessando participação no crime. Negação e fuga são comportamentos naturais em um criminoso. Na verdade, um direito dele. Se um homem se sente acuado, perseguido (independente de quem o persegue, o Estado ou outro infrator), é seu direito fugir, se esconder. Direito pessoal, animalesco, não reconhecido pelo Estado. Aliás, reprimido, pois é para isso que existem mandado de prisão e agentes policiais para cumpri-lo. Mas, neste caso, as probabilidades de fuga do homem eram nulas. Em pouco tempo ele estava cercado, depois algemado, depois embarcado na carroceria da caminhonete que o levaria para a carceragem.
Na volta, ao anoitecer, paramos novamente no assentamento Alvoradinha, para jantar e colher mais depoimentos. Já era madrugada quando demos por encerrada a missão e retornamos para Amarante. Devido a estatura do preso – alto e magro –, o espaço de cada um diminuiu consideravelmente na carroceria da L200. Além do trabalho inútil de buscar conforto entre bolsas, garrafas térmicas e pernas, ainda tínhamos de carregar as armas – pistolas, metralhadoras, revolveres, dezenas de facões apreendidos durante o percurso. Depois de uma hora de viagem, estávamos todos doloridos. Para passar o tempo, alguém pediu para o preso contar uma piada. Após boas risadas por conta da falta de graça da estória, pedimos pra ele cantar uma música. Ele cantou Eu também vou reclamar, do Raul, errando frases e trocando versos.
O resto da viagem foi puro cansaço e silêncio. Eu estava sentado na frente do preso, meio zumbi, sentindo o pescoço ser chicoteado pelos galhos da vegetação da beira da estrada. Na minha diagonal, o soldado dormia profundamente entre um e outro buraco. "Incima daquele ipê tem um nin de arara azu", disse o preso, rompendo o silêncio às duas da madrugada. Ninguém respondeu. Ninguém queria dizer nada. Levantei a cabeça e olhei o ipê. Acima dele, por trás dos galhos, a lua, enorme, derramava a sua luz prateada sobre a copa das árvores. Estávamos percorrendo um trecho bom da estrada. O motorista pisava fundo contra o ar frio que entrava nas nossas roupas. Hipnotizado pelo barulho dos pneus do carro deslizando freneticamente sobre a piçarra, lembrei o personagem do Bruno Ganz galopando um cavalo na beira de uma praia no final do filme Nosferatu, O vampiro da noite. E – numa corrida não menos frenética – sumindo no meio de tudo, sumindo no meio de nada.
sexta-feira, 4 de junho de 2010
WILSON BUENO (1949-2010)

coreografia
deitamos os mortos
nas mais distantes colinas
bem longe de casa
para daqui ver o quanto
se equilibram no horizonte
In: Pequeno Tradado de Animais. São Paulo: Iluminuras, 2003.
segunda-feira, 31 de maio de 2010
ALÉM DA TV OKAZAJO (II)

Se você é um ator, o que é ser um ator?
sou ator porque tenho reconhecimento, através de um carimbo, da profissão, na minha carteira de trabalho, pelo ministério do trabalho. como se fosse um certificado, saca?! paralelo a isso, estou sempre em processo de representação, isto é, estou sempre atuando. ser ator é estar com o corpo preparado para a representação de alguma coisa, sempre ter algo a dizer com o teatro. defino minha atuação em teatro porque não me vejo em televisão ou cinema (não ainda em se tratando de cinema), pois sei que é um tipo de ator diferente, com preparação diferenciada.
Pra fazer teatro é preciso exercício, transpiração, estudo? Ou basta nascer com o cu virado pra lua?
foi-se o tempo que o cu importava ou a conjunção astral ou planetária. hoje, precisa-se ter técnica. entretanto, há outra questão, pois você pode ter vários atores com uma mesma técnica, mas um tem um bilho, digamos assim, diferente. talvez seja o processo criativo, o tesão, o vigor além da técnica, não sei bem ao certo. não acredito no ator que faz canto, sapateado, circo, balé... acredito naquele ator que determina seu caminhar e está sempre pronto - fisicamente falando.
Como é ser o pai? Como é não ser o filho?
acredito na santíssima trindade, ou no triângulo do desperdício. somos múltiplos, sempre. carregamos conosco referências de nossos pais, mães, filhos dos outros, sobrinhos, televisão, cinema, livros, e teatro. ser o pai é representar a repressão da sociedade sobre nossos ombros, mas sempre dando uma brecha, uma fresta para o ser se rebelar, acho que a sociedade força os incautos e liberta/rebela os marginais. gosto de ser marginal, mesmo uma parte minha querendo ser enquadrada. o pai também tem isso, ele é forjado e ao mesmo tempo forja. não ser o filho é perceber parte do pai nele. há uma necessidade de continuidade, de eternização da espécie. não ser o filho é querer ser um pouco ele no pai.
Você, um adarilho, já conheceu algum mar com Cine?
dizem que sou nômade. incorporo um pouco isso, mas não é proposital, o vento me leva, ainda não tenho relação de pertencimento com algum espaço geográfico, físico. sinto falta disso. encontro mares e cines em quase todas as pessoas que eu conheci. acho que é isso que me aproxima delas.
domingo, 23 de maio de 2010
TERÇA CULTURAL
EXPOSIÇÃO FOTOGRÁFICA E VIOLÊNCIA NO CAMPO

sexta-feira, 21 de maio de 2010
JOTABÊ MEDEIROS E A VIRADA CULTURAL

[palco de um homem só, por volta das 14 horas de domingo]
Na Virada, temos de encarar o bafo dos nossos bêbados chatos, nossa falta de educação, de modéstia, nosso egoísmo, a falta de cavalheirismo, o oportunismo.
A Virada escancara nossa feiura paulistana, a carência crônica, a fragilidade existencial. O ser humano cronicamente inviável mostra sua cara na Virada, mijando no poste, quebrando garrafas de vodca e espalhando cacos de vidro, jogando caixas de CDs velhos na calçada, empurrando grosseiramente os fãs que tentaram guardar lugar na primeira fila para ganhar no grito o lugar.
Na Virada, somos obrigados a concordar que o casal de idosos dançando juntinho é bacana, é emocionante, mesmo que a música seja Entre Tapas e Beijos, que a gente não gosta.
Na Virada, a gente se emociona com artistas que não têm mais plateia ganhando uma de “presente”, ao menos durante uma hora.
Na Virada, eu vi um mendigo furtando o algodão doce de um velho vendedor que não teve energia para persegui-lo.
Na Virada, os exibicionistas afetivos fazem carícias íntimas e se beijam com um olho aberto, olhando para ver se alguém está vendo, pois não é possível ser lascivo sem testemunhas.
A Virada revela nosso pior lado burguês, quando a gente dá graças a Deus por ter dinheiro suficiente para descansar no restaurante, enquanto o povaréu se espreme na Avenida São João; quando a gente dá graças a Deus pelo crachá que dá acesso à área reservada, sem precisar ser espremido nas grades.
Este ano eu vi um lado interessante na Virada.
Não, não mudei de ideia em relação à relevância artística, continuo achando que a Virada não é o melhor lugar para quem procura pelo novo, pela invenção. Claro, foi bacana rever o Arrigo no Largo do Arouche, os escudeiros de Frank Zappa na Avenida São João. Mas tem muita farofa e pouco peru nesse banquete.
Mas, nesse espelho fosco que é a Virada, consegui finalmente ver pelo menos um lado interessante: é nela que somos obrigados a uma forçosa convivência com o “vizinho” de São Paulo que evitamos cumprimentar o ano todo no elevador ou na saída da garagem. O vizinho motorista pelo qual desenvolvemos ódio mortal no trânsito por conta de uma fechada, ele está ali do lado na Virada, com o filho vestindo a camiseta do Corinthians.
Toda São Paulo está maciçamente representada nessa monstra, do bêbado ao crackeiro, do batedor de carteiras ao policial relapso, da adolescente sonhadora ao travesti bonito. É a noite em que não adianta usar álcool gel para não se contaminar. A cidade renegada está te pedindo uma ponta de cigarro.
segunda-feira, 17 de maio de 2010
TERÇA CULTURAL

quinta-feira, 6 de maio de 2010
CINEMA NO TEATRO
03/O5 - O GRANDE DITADOR, de Charles Chaplin
Proponente responsável: Antônio Fabrício
10/05 - AS INVASÕES BÁRBARAS, de Dennys Arcand
Proponente responsável: Carlos Leen
17/05 - NÃO MATARÁS, de Krzysztof Kieślowski
Proponente responsável : Anderson Lima
24/05 - O MUNDO IMAGINÁRIO DO DR. PARNASSUS, de Terry Gillian
Proponente responsável : Nice Rejane
31/05 - MOON, de Duncan Jones
Proponente responsável: Gabriel Mendes
O Projeto Cinema no Teatro funciona no Teatro Ferreira Gullar, na Rua Simplício Moreira, centro de Imperatriz, sempre às segundas, sempre às 19h, sempre com entrada gratuita.
P.S.:A partir do mês de maio, a programação do Cinema no Teatro passou a ser definida por seus frequentadores. Cada pessoa, via comunidade no Orkut, pode indicar um filme. Cada indicação deve ser fundamentada através de um texto de até mil caracteres. Se o filme for selecionado, a exibição ficará a cargo do proponente, além do debate após a projeção do filme. Mais detalhes sobre a programação de maio no blog do Cinema no Teatro.