segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

SOUL SAMBA

Baixo, magro, gordo – a alma do samba tem diversos pesos e medidas na noite que engatinha nos botecos da vila, nos botecos da vida, no Boteco do Frei. É no afinar do violão que as pessoas chegam, salientes e sibilantes, e com suas cuícas imaginárias, entram sorrateiras, pisando na ponta dos pés como o malandro buarqueano. Sem demora os primeiros batuques do batera fazem as cinturas gingarem automaticamente, ao passo que de mesa em mesa o abridor de cerveja dos garçons vai caindo de boca, afoito, nos gargalos das garrafas. Deste estranho boquete papocam pequenos chiados, que com o tempo, dadas as repetições, são incorporados pela melodia dos sambas dos bambas. Já pela metade da noite alguns olhos se procuram, mãos se apertam, braços se roçam e se eriçam no contato excitante das gentes. O rapaz sai do banheiro, vai lavar as mãos mas a pia está ocupada por uma mina. Ele então espera batendo o pé no compasso do samba enquanto a desconhecida de cabelo encaracolado arruma a maquiagem. Ela olha mais profundamente dentro do espelho e o vê atrás de si. Os dois se admiram pela tela dessa invenção maravilhosa da humanidade. Depois, apresentados por amigos em comum, se conhecem – “oi”, “tudo bem”, “o prazer é meu” – e seguem conversando encostados no balcão. Por essa hora o vocalista da banda já percebeu que pode dar rock aquele samba. O rapaz aproveita o ponto alto da execução de alguma música do Jorge Bem Jor e fala algo sacana pertinho da orelha da menina, os seus lábios quase a tocando naquela parte que ela gosta tanto. Num cartaz fixado na parede o cantor Belchior pisca o olho pro baixista sério, arrancando-lhe, enfim, o primeiro sorriso da noite. No finzinho do show, sambinhas mais agoniados revigoram o combustível dos brincantes. O casal de desconhecidos vai embora um pouco antes da última música. Estão loucos pra dançarem embalados pelos passos deliciosos da carne, do sexo, do orgasmo. Mas começam pelas línguas, porque línguas também sambam.

Mira, aqui, todas as imagens do ensaio fotógrafico do site Imperatriz Fotos, que inspirou este pequeno texto.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

MELANCHOLIA - LARS VON TRIER

 Três da manhã. Madrugada atípica, frio atípico. Às seis busco o chuveiro do quintal depois de assistir ao filme Melancholia. A água sempre quente do Conj. Vitória cai sobre a minha cabeça e faz o meu corpo fumaçar. No céu nenhum astro, nenhum pássaro. Apenas pequenos estratos de nuvens singram a tímida aurora, o que indica, segundo as mitologias sertanejas, que hoje morreu ou morrerá alguém que eu conheço. Terá sobrevivido a velha cachorra que fora atacada, antes de ontem, pelo pitbull do vizinho? Na casa ao lado, o feroz cachorro late e corre freneticamente arrastando a sua corrente pelo piso cimentado. Por um momento, eu penso na possibilidade dele pular o muro que separa as nossas vidas. Desligo o chuveiro para me ensaboar. A morte é uma torneira que seca ou um cano que estoura? Religo o chuveiro para escoar o Palmolive. Lembro do final do filme e meus pelos se eriçam. Vou pedir pra minha mãe fazer café com bolo frito. Depois, me perfumarei para comprar uma camisa nova.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O REPUGNANTE CHIQUINHO ESCÓRCIO NA REVISTA PIAUI

Nem sou muito fã da revista piauí (na verdade, dificilmente a compro), mas a edição de janeiro de 2012 está no mínimo boa. Na matéria “Peixe no Aquário”, sobre os famosos “Jogos da Solidariedade” estrelados por Romário e Cia, o deputado Chiquinho Escórcio – idealizador dos tais jogos – aparece fuçando a sua lama política logo nos primeiros parágrafos:

"Um ônibus com 24 deputados federais e um senador deixou o hotel Holiday Inn, em Porto Alegre, às 10 horas de uma manhã de novembro e pegou a estrada para Canoas, nas imediações da capital gaúcha. O ônibus teve de fazer uma volta e passar primeiro pelo aeroporto para buscar um 25º parlamentar. O deputado federal Romário de Souza Faria não pôde chegar na véspera como os outros porque era a festa de aniversário de Rafinha, o quarto dos seus seis filhos, e a mãe do menino, da qual é separado, insistiu que ele comparecesse, apesar de o menino fazer anos só em fevereiro.

Romário cumprimentou seus colegas sem entusiasmo e logo se acomodou sozinho no fundo do ônibus. Fechou a cortina, pôs os óculos escuros e não largou o celular. Só tirou os olhos do aparelho quando o grupo começou a zombar de Francisco Escórcio, deputado federal pelo Maranhão, mais conhecido como Chiquinho, que discursava, de pé, perto do motorista. Um deles perguntou: “Seu Francisco, me diga uma coisa, esse seu traje é da Escolinha do Professor Raimundo, é?” Todos caíram na gargalhada, Chiquinho inclusive. Romário deu o primeiro sorriso do dia, levantou-se e puxou o coro: “Oida, oida, oida, Chiquinho hemorroida.”

“Olha a molecagem!”, disse o maranhense de volta. “Você mal chegou e já quer sentar na janela? Tem muita gente com calo na mão de tanto bater palmas para mim.” O ônibus parecia levar uma excursão escolar. O deputado Renan Filho sacou da mochila uma chuteira cor-de-rosa, um acessório da Barbie tamanho gigante, e de pronto foi chamado de maricas. Ele respondeu: “Foi o Jean Wyllys quem me deu. O Bolsonaro achou que é de viado.”

Ex-senador, ex-assessor especial de Renan Calheiros, Chiquinho foi demitido sob suspeita de espionar a oposição, é aliado histórico de Sarney e descobriu há pouco o apelo popular da pelada dos deputados, que ocorre às terças-feiras depois da sessão na Câmara. “Vi que podíamos tirar benefício político do cartaz de Romário, Popó e Tiririca”, contou.

Dito e feito: os Jogos da Solidariedade, que ele idealizou, são um sucesso. Neles, deputados federais e estaduais se enfrentam em partidas pelo Brasil afora e o dinheiro arrecadado é doado para instituições beneficentes. Agora, boa parte dos deputados quer levar o time para seus currais eleitorais. Já há mais de vinte solicitações de jogos. “Vamos ter que passar a sortear os lugares”, disse Chiquinho, que vislumbra uma carreira internacional para o time.

Daquela vez, os parlamentares jogaram em Canoas e em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. O anfitrião Marco Maia, presidente da Câmara, participou dos primeiros dez minutos de cada jogo. Apesar das ameaças (“Se não tocar a bola para o presidente, ele te tira da comissão! Tem que tocar pro presidente!”), ele estava fora de forma, simulou uma contusão e saiu de campo sem marcar gol.

Romário, o ex-pugilista Acelino “Popó” Freitas e os ex-jogadores Deley e Danrlei garantiram o público dos jogos. A partida seguinte, a convite do ministro Edison Lobão, de Minas e Energia, foi dali a duas semanas, em Imperatriz, no Maranhão. O ministro entregou o troféu aos vencedores."

Para ler a matéria completa, assinada por Clara Becker, clique aqui.