terça-feira, 29 de junho de 2010

IURI PETRUS

Devaneios diários, quem não os tem? O amigo Iuri Petrus que o diga. A alguns dias, mandou-me via emeio o texto abaixo (sem título) para apreciação. De pronto, a minha primeira ideia foi publicá-lo, mesmo sem pedir autorização. Mas - como que descobrindo a minha intenção - o autor antecipou-se positivamente ao meu pedido e aí está (dentre outras coisas) o resultado de ser humano.

*

Era um desses domingos em que acordo só porque o estômago começa a doer, mesmo depois de passar quase três horas esperando que num passe de mágica aquela sensação fina e aguda desapareça para continuar sem encarar aquele dia. É, não deu...O corredor do apartamento tá um mormaço purgatorial (o corpo quente, mas sem suar) e sinto a sujeira da noite anterior de trabalho numa multidão que tenta ser carnavalesca com muitas mulheres pedindo para ser presas, massacradas e sodomisadas. Tomo banho. Então saio na minha missão de calar o corpo (talvez fosse melhor esquecê-lo) com um pouco de comida - quem sabe depois ele não se cansava e dormia me afastando daquele dia. Só que nada pior do que a sonolência leve com mistura e confusão de percepções trazendo uma feliz e fugaz sensação do ilimitado da imaginação repentinamente evaporada e doída... Sinto o meu pau pulsar e fico acariciando-o como quem pedi a um bichinho de estimação para ficar quietinho mas, ao mesmo tempo, fica atiçando o bichano como a fazer 8 grosando-o minhas pernas. Não tem jeito: vou ter que gozar. Como tô sem muito saco para encarar certas pessoas, apelo para a imaginação, achando que ainda sobrou um pouco, ao menos para resolver este probleminha! A merda é que nem isso me sobra e tenho que procurar os arquivos mortos e ocultos do meu computador. Até pensei em procurar asiáticas e indianas na web como que num devaneio antropológico e antropofágico de terceiro mundo, mas minha cabeça não tava muito aberta para novidades... Só queira gozar e jorrar. Vejo Bentinho, como que numa espécie de alter-ego do diretor do filme pornô autoreferenciando-se como leitor de Machado e Eça, um seminarista que não consegue se conter frente à tentação de sua priminha safada e a come no chão da sala. Fico vendo aquela mulher e ela me parece tão real, nada parecido como aquelas gostosonas de bundas e peitos enormes e suculentos que se esgoelam de tanto gritar e parece que não gozam nada. Ela tem uma beleza de poucas proporções, pernas finas e duras, seios pequenos e caídos, pentelhos aparados e um grelo tímido. Ela estava realmente sedenta para sentir-se preenchida, mesmo que fosse apenas sua atuação, mas atuava bem... Por essa hora já devia ter gozado há muito e, apesar da solidão e decadência sentidas, fiquei encantado com ela. Sei que ela gozou muito ali naquele chão, via na sua cara, em suas expressões de tesão e desejo cheias de uma alegria fugaz misturadas com a tristeza do pós-gozo. Apesar de todo encantamento já estava contentado e comecei a ler as últimas notícias em um site qualquer quando vi que uma tal atriz que já foi global mas que em seus tempos não áureos fez filmes pornográficos, havia sido encontrada morta em seu apartamento em alguma grande cidade que não me lembro o nome, ao lado de alguns anti-depressivos e talvez uma carta de despedida. Era uma tal Leila Lopes. Fiquei curioso e procurei alguma imagem... Era ela a moça real que me encantou no filme pornô. Gozamos, morremos e tédio. Mas no fundo fiquei feliz porque havia comido uma defunta... E me senti mais humano.

LAERTE (II)


quinta-feira, 24 de junho de 2010

ALÉM DA TV OKAZAJO (III)

TV OKAZAJO - EM RITMO DE CÓPULA

Dias 26 e 27 de junho (sábado e domingo, às 19h e 21h), no Teatro Ferreira Gullar.

sábado, 19 de junho de 2010

ROBERTO PIVA

A PIEDADE

Eu urrava nos poliedros da Justiça meu momento abatido na extrema paliçada
os professores falavam da vontade de dominar e da luta pela vida
as senhoras católicas são piedosas
os comunistas são piedosos
os comerciantes são piedosos
só eu não sou piedoso
se eu fosse piedoso meu sexo seria dócil e só se ergueria aos sábados à noite
eu seria um bom filho meus colegas me chamariam cu-de-ferro e me fariam perguntas por que navio bóia? Por que prego afunda?
eu deixaria proliferar uma úlcera e admiraria as estátuas
de fortes dentaduras
iria a bailes onde eu não poderia levar meus amigos pederastas ou barbudos
eu me universalizaria no senso comum e eles diriam que tenho
todas as virtudes
eu não sou piedoso
eu nunca poderei ser piedoso
meus olhos retinem e tingem-se de verde
Os arranha-céus de carniça decompõem nos pavimentos
Os adolescentes nas escolas bufam como cadelas asfixiadas
arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através do meus sonhos

In:Paranoia. São Paulo: Massao Ohno, 1963.


A PIEDADE - COM ROBERTO PIVA E BEAT GENERATION


In: Filme produzido pelo grupo Interzona, a partir do poema Piedade, com vozes de Roberto Piva, Jim Morrinson, Willian Burroughs, Patti Smith, Jack Kerouac, Antonin Artaud. Músicas de Stockhausen, Lou Reed e Morfine.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

CÓPULAS DO MUNDO

No início dos anos oitenta o Pelé comia a Xuxa. Todo dia. Tempos depois (quando todo dia ele já não a comia), a Rainha dos Baixinhos disse que os pés do Rei do Futebol eram horrendos, pareciam garras. Garrincha, que o diga Elza Soares, nasceu em Pau Grande. Após um gol, Maradona e Caniggia comemoraram beijando-se na boca, o que provocou grande ojeriza na cúpula dos militares do Estado Maior do Exército Argentino. Em 1995, a manicure Cláudia Laudilene declarou ter sofrido assédio sexual do técnico Vanderley Luxemburgo. Segundo ela, ele a "agarrou, beijou e tirou o bráulio para fora num hotel". Corre na internet um vídeo em que Vagner Love faz "love" com a atriz pornô Pâmella Butt. Em 1999, durante a Festa da Uva, Romário não marcou gol, mas comeu vários cachos de uva – um deles, aliás, premiado com a rainha da festa, a gaúcha Fabiana Bressanelli Koch. Salvo engano, foi o Vampêta (mistura de vampiro com capeta) o primeiro jogador brasileiro a posar nu pra revista de corte e costura G Magazine. Em partidas decisivas, o espalhafatoso Valderrama jogava com uma fotografia da esposa dentro da cueca. Jonh Terry pode até ter perdido a braçadeira de capitão da seleção inglesa, mas não desperdiçou o relacionamento extraconjugal com a namorada de um companheiro de clube. No Youtube, há um vídeo em que o atacante sueco Ibrahimovic, antes de um jogo, no meio do campo, encara demoradamente - com cara de gata safada - o Ronaldo Fenônemo. Este, ao perceber, olha para trás, como a procurar o alvo do olhar desejoso. Suspeito que na época o Ibrahimovic já sabia – ah, se sabia – que o Ronaldo tava comendo de tudo. De X-Bacon às duas da tarde a Travestis às duas da madrugada.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

ALDA

Foto: Carlos Henrique Brandão
E nesta quinta, 17 de junho, quem aniversaria é a Aldinha, a garota que quebra o tucum mas não arrebenta a castanha do Pará. São vinte e poucos aninhos de muita simpatia a gostosura. Parabéns.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

PULANDO, PULANDO, PULANDO...

Jumping (1984), curta de animação do japonês Osamu Tezuka.

CINEMA NO TEATRO

PROGRAMAÇÃO DO MÊS DE JUNHO

07/06 - O BEIJO DA MULHER ARANHA, de Hector Babenco
Responsável pela Exibição: Fernando Ralfer

14/06 - RITUAL DOS SÁDICOS/DESPERTAR DA BESTA, de Zé do Caixão
Responsável pela Exibição: Iuri Petrus

21/06 - DONNIE DARKO, de Richard Kelly
Responsável pela Exibição: Marina Cardoso

28/06 - PRECIOUS, de Lee Daniels
Responsável pela Exibição: Marcelo Ricardo

Filme Suplente:

WAKING LIFE, de Richard Linklater
Responsável pela Exibição: Theylon

sábado, 5 de junho de 2010

O ROTEIRO DAS SETE PONTES

Não vi a exposição da Vanusa Babaçu, não bebi a Cerpa do Bar do Beco. Às cinco da manhã da terça, tentando ser amistoso diante de um frentista sonolento, abasteci a moto e rumei para Amarante. Às oito, conforme me dissera por telefone o delegado, já deveria estar a postos, porque meia hora depois partiríamos para a localidade denominada Sete Pontes, na zona rural da cidade. “Sete Pontes? Fazer o que?”, perguntei. “Uma missão. Apenas uma missão”, ele respondeu, deixando transparecer certo júbilo com o meu espanto.

No horário combinado embarcamos. Na frente (o veículo era uma L200 4x4) entraram o motorista, o delegado, um sargento e um cabo PMs – quase a metade do efetivo policial da cidade –, além do ar frio do ar-condicionado. Atrás, na carroceria, disputando pedaços de colchões improvisados como assentos, entramos eu, um soldado, um guarda municipal e mais dois policiais civis. Mesmo sabendo que uma chuvarada se agasalhava no céu amarantino, decidimos partir. E fomos. Todos juntos, fomos – pra frente, Brasil, Brasil, nossa seleção.

A estrada que leva ao Inferno não deve ser muito diferente da estrada que percorremos. Ladeiras íngremes, trechos esburacados, cortinas de poeira, crateras. Em ambos os lados, soberbas fazendas e a vegetação devastada, queimada, com muito gado aparentado mastigar capim sintético e pouquíssimos animais silvestres à vista. Durante a maior parte da viagem, apenas alguns urubus nos acompanharam em vôos panorâmicos. Em trechos menos devastados, um ou outro carcará no topo de alguma árvore chamuscada. Na ausência de mais animais, chegamos a imaginar, ao cruzar um baixio alagado, sucuris se arrastando imperceptíveis como as nuvens longínquas, espessas, pretas, aqui e acolá vazadas pelo sol.

Não tardou para que a chuva chegasse. Algum bonachão ainda sugeriu, de dentro da cabina, que o veículo estacionasse num local coberto para que nós, da carroceria, fôssemos poupados do aguaceiro. Recusamos, ostentando a típica dissimulação dos ofendidos, e deixamos a água nos purificar, lavando nossos corpos barrentos. Depois da chuva, novamente apareceu o sol, mas não tão quente quanto antes. Ao atravessar um vale, visualizamos um arco-íris imenso, majestoso. Lembrei dos meus tempos de menino. “Aquele arco-íris deve estar chupando a chuva”, pensou o menino.

Nossa primeira parada no tortuoso caminho das Sete Pontes foi o assentamento Alvoradinha, o maior e mais organizado do percurso, com energia elétrica, telefonia fixa e associação de moradores. Lá o delegado colheu depoimentos acerca de uma tentativa de homicídio. A vitima, um guarda municipal, havia sido “retalhada” a golpes de facão, após badernar e exibir seu revolver nos bares do centro da localidade. Mais adiante, a imagem mais dolorida, o retrato nu e cru – aqui cabe bem o clichê – da total ausência do Estado – a ocupação denominada Ouro Preto e seus casebres de bambu, mães adolescentes solteiras, energia elétrica ausente. Depois de outro depoimento colhido, seguimos. Na saída, um menino emparelhou-se à caminhonete, e, empurrando um aro enferrujado de bicicleta com um bastão deslizando pela calha, tentou nos acompanhar, disputar uma corrida. Ficaram para trás ele, seu aro enferrujado e o Ouro Preto.

Ápós oito horas de viagem, enfim avistamos a primeira das sete pequeninas pontes que dão nome à localidade (que termina num bar localizado na sétima ponte, na divisa entre Amarante e Açailandia). Fomos lá para caçar os assassinos de outro guarda municipal, morto durante uma bebedeira, com um tiro de espingarda. Chegando no bar onde o crime aconteceu, encontramos um dos suspeitos nas proximidades. Três dias depois, ele havia retornado. Fiquei pensando sobre aquela máxima que diz que o criminoso sempre retorna ao local do crime. Se verdade, se mentira, ali estava o homem, no mesmo local. Morbidez? Curiosidade? Raskolnikov, dias após assassinar a velha usuraria, também retornou ao quarteirão onde partira o crânio da idosa com um machado. Talvez o motivo seja um “chama”, uma “força gravitacional” muito forte que faz com que o homicida retorne. Ou, como se diz no Sertão, uma moeda colocada pelos populares debaixo da língua do morto.

Negando a princípio, o suspeito acabou confessando participação no crime. Negação e fuga são comportamentos naturais em um criminoso. Na verdade, um direito dele. Se um homem se sente acuado, perseguido (independente de quem o persegue, o Estado ou outro infrator), é seu direito fugir, se esconder. Direito pessoal, animalesco, não reconhecido pelo Estado. Aliás, reprimido, pois é para isso que existem mandado de prisão e agentes policiais para cumpri-lo. Mas, neste caso, as probabilidades de fuga do homem eram nulas. Em pouco tempo ele estava cercado, depois algemado, depois embarcado na carroceria da caminhonete que o levaria para a carceragem.

Na volta, ao anoitecer, paramos novamente no assentamento Alvoradinha, para jantar e colher mais depoimentos. Já era madrugada quando demos por encerrada a missão e retornamos para Amarante. Devido a estatura do preso – alto e magro –, o espaço de cada um diminuiu consideravelmente na carroceria da L200. Além do trabalho inútil de buscar conforto entre bolsas, garrafas térmicas e pernas, ainda tínhamos de carregar as armas – pistolas, metralhadoras, revolveres, dezenas de facões apreendidos durante o percurso. Depois de uma hora de viagem, estávamos todos doloridos. Para passar o tempo, alguém pediu para o preso contar uma piada. Após boas risadas por conta da falta de graça da estória, pedimos pra ele cantar uma música. Ele cantou Eu também vou reclamar, do Raul, errando frases e trocando versos.

O resto da viagem foi puro cansaço e silêncio. Eu estava sentado na frente do preso, meio zumbi, sentindo o pescoço ser chicoteado pelos galhos da vegetação da beira da estrada. Na minha diagonal, o soldado dormia profundamente entre um e outro buraco. "Incima daquele ipê tem um nin de arara azu", disse o preso, rompendo o silêncio às duas da madrugada. Ninguém respondeu. Ninguém queria dizer nada. Levantei a cabeça e olhei o ipê. Acima dele, por trás dos galhos, a lua, enorme, derramava a sua luz prateada sobre a copa das árvores. Estávamos percorrendo um trecho bom da estrada. O motorista pisava fundo contra o ar frio que entrava nas nossas roupas. Hipnotizado pelo barulho dos pneus do carro deslizando freneticamente sobre a piçarra, lembrei o personagem do Bruno Ganz galopando um cavalo na beira de uma praia no final do filme Nosferatu, O vampiro da noite. E – numa corrida não menos frenética – sumindo no meio de tudo, sumindo no meio de nada.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

WILSON BUENO (1949-2010)

Felizmente há os que preferem morrer de vodka a morrer de tédio.



coreografia

deitamos os mortos
nas mais distantes colinas
bem longe de casa

para daqui ver o quanto
se equilibram no horizonte

In: Pequeno Tradado de Animais. São Paulo: Iluminuras, 2003.