quarta-feira, 27 de maio de 2009

O OBITUÁRIO DO ZÉ

Um dia acontece. Você está andando distraídasso pela calçada e pisa numa casca de banana bem clichê. Como você nunca treinou educativo de queda – e nem sabe o que isso significa –, você cai tão de mau jeito que a sua cabeça é rachada como aquela melancia que um dia escapou da mão do estivador. Aí vem toda aquela história de velório, parentes chorando e enterro. Mas e daí, pra que perder o humor? Faça que nem o Zé Rodrix: peça caneta e papel e escreva um belo texto sobre o ocorrido. Ou – mais razoável – como você gostaria que tivesse ocorrido.

“Há alguns anos, gostaria de ter a causa-mortis preferida de meu pai: assassinado aos 98 anos de idade com um tiro dado por um marido ciumento que o tivesse pego em pleno ato… mas hoje não mais. Pode ser de fulminante ataque cardíaco, dentro da minha biblioteca, perto o suficiente da família e dos amigos mas afastado o bastante para que, alertados pelos cachorros da casa, já me encontrem morto, com um sorriso nos lábios.

Podem sepultar-me em pleno mar, sob a forma de cinzas, já que não poderei ser sepultado in totum no jardim da minha casa. Se conseguirem isso, no entanto, que não cobrem entradas para visitação, à moda do irmão da princesa: deixem que além das pessoas os passarinhos e os animais da casa se refestelem no lugar, renovando diariamente o eterno ciclo da Natureza.

Ao enterro devem, através de convite formal, comparecer todos que foram aos meus lançamentos de livro: nada mais parecido com um velório do que isso.

Peço parcimônia nos eflúvios emocionais: já as risadas devem ser francas e sem limite. Creio inclusive que prepararei com antecedência uma fita de piadas gravadas para animar o velório e manter o pessoal na boa. Como dizia o Bozo, “sempre rir, sempre rir….”

Lá só deixarei a mim mesmo: mesmo os inimigos que comparecerem para ter certeza de que estou realmente morto podem voltar para casa em paz. Não pretendo puxar a perna de ninguém à noite e nem assombrá-los depois de morto.
Já os amigos podem contar comigo: havendo vida após a morte, volto para avisar, da maneira mais prática e menos assustadora que me for possível. A cremação deve ser feita depois que todos forem embora cuidar de seus próprios afazeres: enfrentar as chamas do forno terrestre já será um grande intróito para a vida eterna.

Se conseguir, tentarei ser crooner da grande Orquestra de Jazz do Inferno, vulgarmente chamada de SATANAZZ ALL-STARS: como já vou chegar lá tenente ou capitão, dada a minha imensa taxa de maldades realizadas sobre a Terra, creio que não será difícil. Meu castigo certamente será cantar MPBdQ por toda a eternidade, mas mesmo com isso ainda se pode encontrar algum prazer, assim na terra como no inferno…. é o que veremos a seguir.

No enterro podem tocar de tudo, menos as músicas que eu tenha feito. Minha morte servirá certamente para que se livrem não apenas de mim mas também de minhas obras. Os herdeiros também não merecem ouvi-las, sabendo que nada herdarão de minha lavra, porque, sendo eu adepto da política do VAI TRABALHAR, VAGABUNDO, como meu pai fez comigo, já tomei providências para que essas músicas não lhes rendam nem um tostão furado. Sendo um velório moderno, recomendo músicas de carnaval antigo, as indiscutíveis, claro, com algumas discretas serpentinas e confetes jogadas sobre o caixão, fechado, naturalmente.

Morrer num Sábado à tarde, ser enterrado num Domingo antes do almoço, e estar completamente esquecido na manhã de Segunda, sem atrapalhar a vida profissional de ninguém: eis a perfeição que desejo na minha morte.

Muito grato.

beijos

Z”



Zé Rodrix morreu na semana passada. Valeu, Zé. Contiuamos ouvindo teu rock rural.

sábado, 23 de maio de 2009

ENCHENTE, CACHAÇA E PESCARIA

Recebi do Alain Dellon (o bancário, não o ator) um emeio contendo um vídeo sobre as enchentes no nosso estado. O vídeo foi produzido por Fernando Donasci, repórter fotográfico da Folha de São Paulo que esteve em Bacabal, uma das cidades mais atingidas. A foto que antecede o post também é de autoria do mesmo repórter. O vídeo é credor do texto.


Durante as enchentes no Maranhão, o modus operandi de alguns barqueiros de Bacabal me lembraram Caronte, o barqueiro mitológico responsável por transportar as almas do gregos mortos para o outro lado do - também mitológico - rio Aqueronte. Com uma diferença bem real, pra não dizer mortal: enquanto Caronte, sóbrio, se ocupava do transporte dos mortos, os barqueiros de Bacabal, bêbados, se ocupavam do transporte dos vivos. Explico melhor. Depois de passar algumas horas à deriva em suas embarcações bebendo pinga, à altura dos telhados das casas alagadas, os estranhos barqueiros de Bacabal eram acometidos de grande espírito solidário e iam "socorrer" os irmãos desabrigados, entre eles muitas crianças, idosos e mulheres grávidas. Ajudaram a salvar muitas vidas, é verdade, mas também contribuíram para algumas mortes.

Um dos motivos das pessoas relutarem em abandonar suas casas eram os saques. É que outros barqueiros, menos solidários e mais espertos, aproveitavam a ausência forçada dos moradores para saquear as residências. Panelas, botijões de gás, prateleiras, fogões, portas, mão de pilão - nada escapava ao apetite dos saqueadores. Também foram vítimas da ação dos piratas ribeirinhos alguns clubes, escolas, comércios e até igrejas - uma santa foi roubada do altar de uma paróquia alagada. Somente com a presença mais efetiva do Exército, da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros é que os saques diminuíram. Um caso curioso é o de um saqueador que, na manhã seguinte à ação meliante, descobriu ter saqueado a própria casa. Devia ser um dos barqueiros bêbados.

Um outro fato curioso diz respeito aos homens que passavam o dia nos telhados das casas alagadas. Estes também bebiam pinga, a exemplo dos barqueiros, mas não se aventuravam no transporte dos desabrigados, deixando tal empresa a cargo dos bombeiros. Também não saqueavam casas, nem comércios e tampouco roubavam imagens das igrejas. O passatempo deles resumia-se, além da manguaça, a pescar e falar mal da vida alheia. E os pequenos peixes que pescavam tinham destino certo. Não iam pra panela, não viravam refeição para os desabrigados - o destino dos pequenos carás era a pança dos gatinhos que se encontravam ilhados em cima das casas. Se não fosse a boa ação desses pescadores bebuns, muitos bichanos teriam morrido de fome.

***

13 pessoas já morreram em função das enchentes no Maranhão. O Estado de São Paulo mandou militares do Corpo de Bombeiros especialistas em resgate de alto risco. O Estado de Santa Catarina mandou técnicos para assessorar o governo do Maranhão na captação de recursos federais.

***

Pra quem puder ajudar, esses são os dados bancários da Defesa Civil do Estado:Caixa Econômica Federal, agência 0027, conta corrente 1000-2, operação 006.

***

Pra ver o vídeo do repórter da Folha :

quarta-feira, 20 de maio de 2009

CADEIRA ETÍLICA

                                                           Tou aqui sentado. Fumo um, mas já fumei dois. Tou com as pernas estiradas, metade dentro e metade fora do bar. Tou olhando o movimento, brother, a vida passando na frente do meu copo de cerveja. E como tem carro, cachorro, homem e mulher pela rua. Tem uns manos que passam na frente do boteco e olham pra dentro e conseguem ver, pelo espaço da janela entreaberta (é um bar com portão e janela), o resto de uma jogada de sinuca - o bolão batendo na bola oito e suicidando no buraco do meio. Os que jogam sinuca também veem um pouco os que passam. E veem também o dono do bar perguntando se eles tão anotando direitinho as fichas. Claro que tão, os caras são gente boa. Tá tudo certo. Tudo no seu lugar. Prova disso é a menina mais bonita do condomínio que tá saindo no mesmo horário de sempre pra facul. E hoje ela tá mais linda usando um lenço vermelho no pescoço. O garçom sacana percebe esse pequeno detalhe emocional e me dá um toque de leve enquanto leva uma cerveja pro casal que tá sentado ao lado e que acabou de comprar um pacote de ovo codorna do menino de sempre. Aí chega um amigo e me pede um cigarro. Ele tá todo bobo com um exemplar novinho d'As Flores do Mal na mão. "Tem gente que compra livro só pra mostrar pros outros, né, brother?", eu penso em falar brincando, mas o bicho é mais rápido e começa a falar um bocado de coisa até chegar ao cúmulo de encontrar semelhança facial entre o dono do Bar e o Jack Nicholson do filme O Iluminado. Eu discordo e arremato dizendo que antes de chegar no bar eu descobri que nasci um século depois da morte do Dostoiévski. Não sei por que ele entende isso como uma senha pra pegar o beco e se manda com o livro debaixo do braço, fumando o cigarro que lhe dei. Peço a última cerveja pro garçom e enquanto ele vai buscá-la eu fico imaginando qual seria minha reação se ele morresse bem alí no caminho entre o freezer e a minha mesa. Sei lá, um curto circuito no coração ou uma bombinha atômica explodindo na cabeça do cara. Caralho, que mente a minha. Mas de uma coisa tenho certeza: seria foda ter que ir embora sem beber essa cerveja. Tou pensando nisso quando chega uma vizinha do bar pedindo pra alguém trocar uma lâmpada queimada na casa dela. "Mas como, minha senhora?", eu falo irritado. "Não tá vendo o garçom agonizando aí no chão não? Vá chamar uma ambulância, vá. Dona de casa sem coração".

CINEMA NO TEATRO E TRÊS REAIS NA UFMA

Queridos inimiguinhos, na próxima segunda, dia 25, segundo o mural do Teatro Ferreira Gullar, esses serão os dois filmes exibidos no Projeto Cinema no Teatro, a partir das 19h:


Quase Dois Irmãos (ficção, 102 min.), de Lúcia Murat. Durante a ditadura militar, presos políticos e assaltantes de bancos cumprem pena no mesmo presídio. Do encontro desses dois mundos nasce o Comando Vermelho e outros "malditos frutos" que se desdobram no tempo.

O Prisioneiro (ficção, 17 min.), de Eric Laurence. O homem passa a vida buscando liberdade. Mas quando se vê diante dela, não sabe o que fazer, não consegue se libertar da sua própria prisão.

Classificação: 16 anos.


E logo mais, às 16h, no auditório da Universidade Federal do Maranhão, será exibido o cutametragem 3 Reais (documentário, duração não informada), do meu amigo Antonio Fabrício. O curta narra as aventuras e desventuras dos trabalhadores em Moto-Taxi em Imperatriz. Corram. E se puderem, peguem um moto-taxi pra chegar até lá.



















Classificação: livre para todos os públicos.


segunda-feira, 18 de maio de 2009

ANIMADOS E INANIMADOS

Desenho animado para maiores de dezesseis devidamente desacompanhados dos pais. Seis curtas de animação. Nacionais e premiados. Escatológicos e bizarros. Transbordando ácido e negro humor. Um prato cheio - de urina, de fezes, de esperma escorrendo em Classificados de Sexo de jornal. Foi o que rolou hoje no Ferreira Gullar, através do Projeto Cinema no Teatro, uma parceria entre a Associação Artística de Imperatriz e o Ministério da Cultura.

Destaque para o curta de Allan Sieber ( diretor, entre outros, do herético Deus é Pai). Em Onde Andará Petrúcio Felker, Allan narra a trajetória do artista e agitador cultural Petrúcio Felker, contada por meio de depoimentos de seus contemporâneos. Ácido, engraçadíssimo. Crítica contundente às galerias de arte dos grandes centros. Afinal, seria realmente arte segurar um gato morto por dias num salão de um MAM da vida? E uma escultura de estrume, também seria uma manifestação artística? Petrúcio é o típico artista extremo.



Antes de me mandar pro Cinema no Teatro, concluí a leitura da HQ As Helvéticas, do italiano Hugo Pratt. Impressionante trabalho. Uma magnífica aventura do antiheroi solitário Corto Maltese pela Suíça e por um passado mágico e alquimista. Como em outras aventuras, nesta Corto também encontra uma figura histórica. Desta feita, tem a oportunidade de conhecer Hermam Hesse, chegando a ter uma visão na casa do escritor alemão, antes de submergir no Mundo dos Sonhos. Valeu muito a pena os 25 reais que desembolsei prum sebo de São Paulo. A edição (portuguesa por sinal) é belíssima, ricamente ilustrada e colorida.
Corto Maltese é uma espécie de marinheiro que viaja por todo mundo, sempre na picada de novas aventuras. Não por acaso tem um pouco do próprio autor, Hugo Pratt, que também viajou meio mundo, chegando a morar na Argentina e no Brasil. Talvez daí o conhecimento de causa ao retratar os espaços geográficos por quais Corto transita. Em Helvéticas, Hugo gasta umas 30 páginas situando o leitor na Suíça. Depois coloca Corto em cena, sem músculos ou superpoderes. Apenas, como diz aquela musiquinha, com "um desejo enorme de se aventurar".

sexta-feira, 15 de maio de 2009

FALO DURO PRA ANA FICAR TRANQUILA

[Escrevi isso - "isso" porque na verdade não sei do que se trata (conto, crônica ou qualquer outra coisa que não o valha) - por volta de 2001. Na época fazia parte de um grupo - oh, um grupo! - que se dizia literário. Eu, Cláudio Marconcine, Sérgio Barroso, Carlos Leen e Sebastião Alves. Nos encontrávamos uma vez por semana, no apê do Cláudio, pra discutir e produzir literatura. Como se chamava mesmo o nosso grupo - Vivos? Clã Destino? Na Verdade não duramos um mês - Mortos.]




I

Ana detestava mijar de cócoras. Achava isso humilhante. Era como ter que ajoelhar-se perante alguma divindade para, só depois de seu consentimento, receber a permissão para urinar. “Ajoelhar e receber a graça”, pensava, ao sentar nas bordas melequentas d’algum sanitário. Grande merda! Nem nessa horas a mulher deixava de ser submissa. Por isso desejava, em vez de uma xoxota, possuir uma pica.

Não queria largar de ser mulher, que fique claro. Queria apenas, no momento de urinar, ter um cacete. Não precisaria agachar-se, gastar papel higiênico, enfrentar as imundas privadas dos idem banheiros ou, nas ausência destes, esconder-se atrás de postes, árvores, automóveis. Não, nada disso. Apenas levantaria a saia e afastaria um pouco a calcinha. Chóóó e pronto – guardaria o cacete novamente. Não era simples?

Nada de ficar um tempão agachada, esperando o mijo que às vezes nem vinha. Em pé, a bexiga certamente teria mais liberdade, a urina viria mais rápido. Sem falar nas inúmeras coisas que poderia fazer com um cacete. Repetindo: não que ela quisesse deixar de ser mulher. Agradava-lhe ser feminina, pintar-se, fazer chapinha, trepar com homens e isso e aquilo outro. Mas quantas estripulias – pensava – não poderia fazer com um treco daqueles entre as pernas?!

Fora sempre seu sonho sacolejar o bicho, brincar de quem mija mais longe, lavá-lo, ajeitá-lo dentro da cueca. Já fizera isso com o de seu namorado, Flávio, mas não era a mesma coisa. Não era como se fosse seu, a extensão real de seu corpo. Por isso morria de inveja ao ver Flávio urinando. Sempre que este ia ao banheiro, corria atrás. Quando Flávio não a deixava entrar, ficava espiando pelo buraco da fechadura, amargamente imaginando que jamais poderia sacolejar a vagina com tanta desenvoltura.

Se pudesse ser ele, sendo ela, a primeira coisa que faria era mijar do alto de uma ponte. Levantaria a saia e pronto. Tudo muito simples. Depois, segurando o pau com as duas mãos, escreveria emocionada o nome de sua paixão no asfalto: F-l-á-v-i-o. E se ainda houvesse urina o suficiente, também desenharia alguns corações, e flechas traspassando-os. Prova de amor maior, não fosse a impossibilidade de possuir um pênis.


II

Flávio estava desnudo na cama. Ao seu lado, Ana despia-se, iluminada apenas por uma luz insuficiente que precipitava-se pela porta entreaberta. Já nua, subia lentamente na cama, rastejando qual uma cobra. Sabia que ele excitava-se ainda mais ao vê-la imitando uma cobra. Ajoelhada sobre suas pernas, os braços cruzados para trás, Ana sorriu. Um incêndio silencioso espalhava-se por todo o seu corpo. Em sua mão, estrategicamente posicionada, a navalha luzia e reluzia.

“Te amo, Flávio”, ela disse e - zap! - desferiu o golpe certeiro em seu falo.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

POUCA GENTE CONHECE

Pensei que estava completamente atrasado, mas quando cheguei na Uema, por volta das 8 da noite, o evento acerca da obra do maranhense João do Vale tinha acabado de começar.

Um público bom, no pátio da Uema mesmo, se espremia para ouvir depoimentos sobre o João e assistir ao belo documentário Muita Gente Desconhece, um apanhado das várias fases da vida do cantor e compositor maranhense, compreendendo 1) a sua chegada ao sudeste do país, época em trabalhou como pedreiro, no Rio; 2) a peregrinação em torno das rádias e músicos daquela cidade, tentando mostrar suas composições; 3) os primeiros sucessos musicais, na voz de outros cantores ; 4) a participação no Show Opinião, ao lado da bela Nara Leão e Chico Buarque; 5) a composição de músicas para alguns filmes, coisa que eu desconhecia; 6) enfim o reconhecimento musical, e as parcerias com diversos medalhões da MPB; 8) o AVC que pouco a pouco o matou; e 9) os seus últimos dias de João na cidade de Pedreiras, rodeado dos antigos amigos.

Foi bom ver um dos filhos do João, presente no evento mas ausente nas falas. Uma mulher, que presumo ser sua esposa, foi quem falou a maior parte do tempo, enquanto o filho do João permanecia estático, olhando fixamente pra mulher ao microfone e parecendo confirmar o que ela dizia. Também ele, filho do pedreiro, acometido de um AVC: seu braço direito imóvel pendendo sobre a perna, e seu aspecto abstraído olhando o pai no telão, doente numa enfermaria de hospital, me fizeram lembrar um conto da Marina Colasanti, A nova dimensão do escritor Jeffrey Curtaim, matador logo em seu primeiro parágrafo: "Quando o coágulo de sangue explodiu na cabeça de Jeffrey Curtaim, algo nele foi cortado, como uma mangueira ou um caule. E o seu pensamento viu-se subitamente decepado do corpo". Terminado o documentário, tive a vontade de conversar com o filho do João, falar-lhe da minha admiração por seu pai, mas algo também cortou-se em mim, decepando-me do intento, no que desisti.

Terminei a noite no Bar do Claudeci, assistindo ao jogo entre Flamengo e Internacional, na companhia de alguns amigos. Foi bom torcer contra a Urubuzada enquanto recebia a notícia de que o Vascão metia quatro a zero no Vitória do Bahia. A cerveja estava geladíssima, típica canela de pedreiro. De quebra, bebi cinco deliciosas doses de uma pinga temperada que só o Claudete sabe fazer (fragrância de abacaxi), tirando o gosto com limão e Arisco. Mas como o trabalho me esperava no dia seguinte (e continua me esperando, porque não fui trabalhar), tão logo o jogo terminou eu me mandei pro Hotel Subterrâneo, ligeiramente bêbado, ligeiramente feliz, cantarolando "Meu samba é a voz do povo/Se alguém gostou/Eu posso cantar de novo".

domingo, 10 de maio de 2009

SÁBADO DO FILHO, DOMINGO DA MÃE

Aos sábados não paro neste Hotel Subterrâneo. Só dou as caras mesmo no dia seguinte, pra dormir, recuperar-me dalguma folia. Foi o que fiz e estou fazendo, aproveitando esta tarde úmida de domingo pra zapear entre o Programa do Silvio Santos e este Mundo Pixel.

Sábado

A noite de sábado começou boa, ficou meio ruim no meio e voltou a ficar boa no final. Jéssica, uma Perna de Saia que de vez em quando me dristrai, me telefonou por volta das 7 da noite confirmando nossa ida ao Show do Vanderley Andrade, no Clube da Sucan. Tudo muito bom até chegarmos lá. Mas depois a menina começou a entrar nuns bodes, a atazanar minha paciência, que acabei desistindo dela e do Wanderley. Troquei os dois pelo Bar Do Claudeci. E não me arrependi.

No Claudeci estavam Fred, Benzão, Allan e sua amada, além do Josélio completamente on-line ciscando de mesa em mesa. Aliás, apenas duas mesas, já que estávamos bebendo no balcão. Foi quando a noite voltou a ficar boa. E engraçada, porque entre Benzão e Fred sempre rola uma energia superpositiva, que não os deixa ficar um só minuto sem discutir. E assim fomos, de gozação a gozação, de copo a taça, de beiju recheado a maconha, de cinema trash a Gripe Suína.

Domingo

Acordei por volta das 11 horas. Na verdade fui acordado pela voz de minha mãe ao microfone, que comandava na entrada do Hotel Subterrâneo um grupo de outras mães, comemorando o dia oferecido a elas. Minha mãe gosta falar. Das mães alí presentes foi a que mais fez uso do microfone. "Ser mãe é padecer no paraíso". Eu ouvia sua voz emocionada ecoando no lado de fora do hotel. "Mãe só existe uma". Eu estava louco pra dormir. Minha mãe gosta de falar, de se emocionar, de chorar. "Uma mãe morre por um filho". Peguei um abafador de ouvido na gaveta do criado-mudo, mudei de posição na cama. Acho que puxei pro meu pai, o Coração de Pedra.

Depois de muito blá, blá, blá, a mães se dispersaram e foram cada uma pras suas casas servir os seus respectivos almoços. Minha mãe passou pelos corredores do Hotel chamando os demais familiares pra matar a broca. Um magnífico frango grelhado estava sobre a mesa. Um dos meus pratos predietos: arroz com milho, peito de frango assado (com o courinho crocante), farofinha, feijão e vinhagrete. E claro, uma Coca-Cola bem gelada, que depois sempre me faz arrotar como um condenado.

E como tá um dia nublado, portanto deveras frio (que palavra linda!) pra latitudes tão tropicais, eu pedi pra minha mãe avisar na portaria do Hotel Subtrrâneo que eu, o gerente do estabelecimento e seu hóspede mais ilustre, não estou pra ninguém, em nenhuma hipótese. É que decidi morrer por algumas horas.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

AS MOTOQUEIRAS QUE CORREM DEMAIS

São duas. Uma eu sei que mora em meu bairro, o Conj. Vitória. A outra, por muito vê-la se deslocando entre os bairros Centro e Bacuri, suspeito que resida em um desses dois bairros. Mas o que (me) importa aqui não é onde moram, e sim o modo como transitam em suas respectivas motocicletas.

A primeira é branquinha, pequenina, cara de lolita. Montada em sua Broz 150, entretanto, transforma-se numa espécie de motociclista The Flash. Não é de hoje, muito menos de ontem, que ao transitar pela BR-010, fazendo meu percurso cotidiano (Conj.Vitória/Centro), me surpreendro pelo Zuuuuuuum de seu motor ao me ultrapassar e ganhar distância -- eu a míseros 80km/h e ela com uns 120 no velocímetro.

A segunda é uma baita morena. Sempre trajando calças apertadíssimas e blusinhas que deixam sua costa nua. Parece uma centaura em cima de sua moto grande, branca, possivelmente uma Tornado 200. Digo "possivelmente" porque de fato nunca pude visualizar a sua verdadiera marca, dada a velocidade e ferocidade com que essa Kátia Flávia bronzeada joga lenha em sua caldeira. Rainha do zig-zag, costura o trânsito e o olhar dos motoristas.

Queridas divas minhas, acaso vocês sabem por que o preço do Seguro DPVAT cobrado dos motociclistas é geralmente três vezes mais caro do que o cobrado dos demais condutores? Sabem quantos pneus tem o veículo que pilotam? Já viram alguma matéria de jornal em que algum indefeso carro foi atropelado por uma moto? Com quantos ossos quebrados se compra uma muleta? E quantos pregos são necessários para fechar um caixão?

Sim, sei que a vida é corrida, é combate. Temos que perseguir com unhas e dentes o caminho que nos leva ao faz-me rir -- e quanto menos tempo gastarmos nos deslocamentos, melhor, não é isso? Ok, eu próprio já tive acessos de imprudência suicida. Mas não vale a pena. Corramos menos. Maneiremos, garotas. Puxemos menos o acelerador. Ou vocês acham que vai dar tempo do air-bag se abrir antes dos seus belos corpos se estatelarem contra o chão, o poste, o caminhão?

quinta-feira, 7 de maio de 2009

BEIJO NA BUNDA E ATÉ O CINEMA NO TEATRO DA SEGUNDA

Fui ao Ferreirinha ("Teatro de Bolso", como diz o Cláudio Marconcine) no final do mês de abril, ansioso para prestigiar o retorno do Projeto Cinema no Teatro, agora sob a batuta do novo presidente da ASSARTI, o renomado maestro Pier Paolo Pietrini. Cheguei uns vinte minutos adiantado e quase tive um infarto quando um desavisado me “desavisou” que não haveria sessão. Informe incorreto, logo retificado pelo Jairin, uns dos projetistas do "Cinema" e atual vendedor de água das paragens. "Daqui uns dias vou botar pipoca aqui também". Beleza, Jairin. Ótima idéia. Falando nisso, cadê aquele velhinho pipoqueiro que de vez em quando aparecia com seu carrinho pela porta do Teatro?

Mas aí a sessão iniciou, pontualmente às 19h, sem dar tempo pro Jairin responder a pergunta do parágrafo anterior. Prezadas leitoras deste jornal, a única coisa que posso dizer é que os cinco curtas-metragens que se seguiram foram realmente excelentes. Cinco documentários que exploraram como tema a música. A música dos LPs de um velho colecionador do Ceará; a música da Moda de Viola, triste narrativa de uma pobre família mineira que ganha a vida (ou tenta) fabricando violas caipiras; a música sublime de um desconhecido trombonista brasileiro; a música “agressiva” dos primórdios do Punk nacional; e a música do mangue pernambucano – do Otto, do Fred 04, da Nação Zumbi, do Chico Science.

Não fiquei para assistir a segunda sessão. Era um filme de amor. (Perdoe-me, Senhor, por não ter tino para o amor.) Mas uma linda “neocinéfila” que conheci na escadaria do Teatro ficou. Aliás, ela me falou que só foi até ali para assistir o tal filme de “amor”. Um filme que, certamente, deve combinar muita com ela. Porque ela é linda. E ela me disse, dentre outras coisas, que trabalha próximo ao Teatro. E que vende perfumes. Yes Perfumes.

Ah, antes que eu me esqueça, lembrei de uma coisa. Méritos para o Domingos Cézar, repórter dO Progresso. Sempre aos domingos (ou não tão sempre assim), ele está escrevendo matérias sobre os filmes que serão exibidos no Projeto Cinema no Teatro, uma parceria entre o Ministério da Cultura e a ASSARTI, que funciona no Teatro Ferreira do Gullar, todas as segundas-feiras, pontualmente às 19h. Foi através de matéria dele nO Progresso que fiquei sabendo que seriam exibidos os tais documentários. Valeu aí pela dica, Domingos. E até as próximas segundas.