segunda-feira, 26 de abril de 2010

ROBERTO BOLAÑO

Lupe


Trabalhava na avenida Guerrero, a poucas quadras da casa de Julián/ E tinha 17 anos e havia perdido um filho./ A lembrança a fazia chorar naquele quarto do hotel Trevo,/ espaçoso e escuro, com chuveiro e bidê, o lugar ideal/ para se viver por alguns anos. O lugar ideal para escrever/ um livro de memórias apócrifas ou um ramalhete/ de poemas de terror. Lupe/ era magra e tinha as pernas compridas e manchadas/ como as dos leopardos./ A primeira vez nem sequer tive uma ereção:/ tampouco esperava ter uma ereção. Lupe falou de sua vida / e do que era a felicidade para ela./ Depois de uma semana voltamos a nos ver. Encontrei-a/ numa esquina junto com outras prostitutas adolescentes,/ apoiada no para-lamas de um velho Cadillac./ Acho que ficamos felizes de nos ver. A partir de então/ Lupe começou a me contar coisas de sua vida, às vezes chorando,/ às vezes trepando, quase sempre pelados na cama,/ olhando o céu raso de mãos dadas./ Seu filho nasceu doente e Lupe prometeu à Virgem/ que largaria sua profissão se seu bebê sarasse./ Manteve a promessa por um mês ou dois e logo teve que voltar./ Pouco depois, seu filho morreu e Lupe dizia que a culpa/ era dela por não cumprir o prometido à Virgem./ A virgem levou seu anjinho por sua promessa não cumprida./ Não sabia o que lhe dizer./ Eu gostava de crianças, claro,/ mas ainda faltavam muitos anos para que soubesse/ o que era ter um filho./ Por isso ficava quieto e pensava em como era estranho/ o silêncio daquele hotel./ Ou tinha as paredes muito grossas ou éramos os únicos ocupantes/ ou os demais não abriam a boca nem para gemer./ Era tão fácil lidar com a Lupe e sentir-se homem,/ e sentir-se um infeliz. Era fácil acompanhar seu/ ritmo e era fácil ouví-la se referir/ aos últimos filmes de terror que havia visto/ no cine Bucareli./ Suas pernas de leopardo enlaçavam meus quadris/ E afundava sua cabeça no meu peito procurando os meus mamilos/ ou o latido do meu corãção./ É isso o que eu quero chupar, me disse uma noite./ O que, Lupe? Seu coração.

Tradução: Rodrigo Garcial Lopes.

In: Revista Coyote n. 17. Outono de 2007. Londrina (PR).

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